Bruno Varella Miranda- Mestre em Administração pela USP
Como os leitores dessa coluna sabem, em mais de uma oportunidade manifestamos a posição de que o regime tributário da cadeia do café era complicado demais ou, pior, criava distorções indesejáveis. Não por acaso, contribuiu para fomentar a fraude; basta nos lembrarmos da “Operação Broca”. Ademais, “oferecia” um benefício – os famosos créditos – que, na prática, só era aproveitado por uma parte dos agentes atuantes no mercado. O resultado é conhecido da maioria: queixas (quase) generalizadas. Com a exceção daqueles que se beneficiavam das distorções existentes, era difícil encontrar alguém que elogiasse o regime tributário da cadeia do café.
Em nossa opinião, é boa a notícia de que o governo brasileiro decidiu simplificar as coisas. Ao suspender a cobrança do PIS/Cofins para o café verde, dá uma chance para a mitigação das distorções. A medida, como não poderia deixar de ser, não veio sem alguma polêmica; tanto isso é verdade que as gigantes do setor são contra as mudanças. No geral, porém, acreditamos que era necessário que esse passo fosse dado.
Isso não significa, porém, que estejamos prestes a ingressar na era do “regime tributário perfeito”. Em outras palavras, ninguém pode garantir que a medida do governo brasileiro não traga efeitos colaterais. Matéria encontrada no jornal Valor Econômico descreve as principais críticas. Há, por exemplo, a queixa de algumas empresas de que as mudanças irão aumentar a carga tributária. As mesmas argumentam que, com sua decisão, o governo opta por um sistema “arcaico”, beneficiando as grandes tradings.
Em relação ao possível aumento da carga tributária, é preciso lembrarmos que uma discussão da questão tributária no Brasil deve levar em consideração ao menos duas dimensões. Em primeiro lugar, é preciso analisar o peso dos impostos sobre os agentes econômicos. Ademais, faz-se necessária uma avaliação das implicações do atual sistema para a criação de distorções que prejudicam a competição.
Não é novidade para ninguém que a carga tributária no Brasil é alta e, infelizmente, parte do dinheiro é mal gasto. Esse problema, entretanto, não pode ser resolvido da noite para o dia; entre outros motivos, é fundamental lembrarmos que um alívio no peso dos impostos em nosso país deve ser pensado de forma global, em um projeto de longo prazo. Em outras palavras, deve-se evitar que eventuais concessões entrem na lógica da “troca de favores”, prática tão presente em diversos momentos de nossa República.
Por outro lado, a suavização de distorções derivadas de anos de medidas sobrepostas direcionadas a um setor específico é algo que pode e deve ser buscado. Trata-se de uma medida menos complexa, e que, por envolver um número menor de interessados, permite a negociação. Não é de hoje que muitos dos agentes ligados ao setor discutem a questão. Nós mesmos testemunhamos um desses debates, no final de 2009. Contar com todos no mesmo barco seria impossível; de qualquer maneira, o simples fato de que algo concreto foi proposto já deve ser elogiado.
Demorará algum tempo até que os efeitos das medidas sejam plenamente sentidos por todos – cafeicultores, torrefadores, exportadores, pesquisadores. É possível, quem sabe, que daqui a alguns meses seja necessário outro texto, criticando os resultados dessa política. Esperamos que não seja o caso. Se conseguir eliminar a maior parte das distorções existentes na atualidade, a decisão do governo brasileiro já terá valido a pena.