O café é produzido em mais de 60 países em desenvolvimento e é consumido principalmente em países desenvolvidos, onde as vendas anuais no varejo são superiores a US$ 70 bilhões. Estima-se que, em todo o mundo, 25 milhões de pessoas dependam da produção de café para sobreviver e que 100 milhões dependam do setor cafeeiro de modo geral.
Tem sido observado, no entanto, que a redução dos preços pagos aos produtores não tem se refletido em diminuição dos preços de venda de café torrado aos consumidores. Entre os pesquisadores há consenso de que o capital gerado, os recursos destinados aos cafeicultores e aos países produtores têm se reduzido nos últimos 15 anos. Acredita-se que a criação de instrumentos que possibilitem que uma proporção desse valor agregado chegue ao produtor poderá reverter ao menos parte dessa situação desestimulante atual.
Atualmente, na busca de soluções para a crise do café, coloca-se muita expectativa na certificação dos cafés sustentáveis como alternativa para aumentar o valor econômico, social e ambiental da produção para muitos cafeicultores, bem como ampliar sua comercialização, promovendo o desenvolvimento regional.
Atualmente o Brasil é o maior produtor mundial de café, com 33 milhões de sacas na safra 2005/2006 (Conab, 2006) e o segundo maior consumidor mundial, totalizando 15,5 milhões de sacas em 2005 (Abic, 2006).
Durante muitos anos o café foi o principal produto das exportações brasileiras, mas tem perdido importância, caindo de 60,0% do valor total das exportações em 1962 para 2,8% em 2000 (Carvalho, 2001). Porém ele ainda é muito importante do ponto de vista social, pois é produzido em cerca de 370 mil propriedades rurais, grande parte delas de agricultura familiar (Pedini, 2005), gerando, direta e indiretamente, cerca de 8,4 milhões de empregos.
O setor engloba, ainda, cerca de 10 indústrias de café solúvel, 75 cooperativas, 170 exportadores, 1170 empresas de torrefação e moagem e 2400 marcas do produto (Abic, 2006). Apenas no Estado de São Paulo há 300 torrefadoras, muitas delas micro e pequenas empresas familiares (Abic, 2006).
A maior parte do café brasileiro é exportado na forma de café verde - grãos de café beneficiados, mas não torrados - principalmente para Alemanha, EUA, Itália e Japão. Um pequeno volume é exportado na forma de café torrado e moído e de café solúvel, correspondendo a menos de 1,0% do valor total de café exportado.
O café é produzido em 17 estados brasileiros, sendo que o maior produtor é o estado de Minas Gerais, que respondeu por cerca de 46,0% da produção total de cafés na safra 2005/06. O segundo maior estado produtor de café é o Espírito Santo e o terceiro é São Paulo. Juntos, Minas Gerais e São Paulo respondem por cerca de 80,0% dos cafés brasileiros com algum tipo de certificação.
Programas de certificação de café
Os principais programas de certificação do café no mercado internacional são:
- Comércio justo (Fairtrade)2: direcionado ao sistema de comercialização, assegura aos produtores um preço mínimo acrescido de um prêmio que deve ser utilizado para investimento em projetos comunitários. É voltado exclusivamente para grupos de produtores familiares e inclui também alguns critérios de preservação ambiental.
- Orgânica: adota os critérios e normas da IFOAM - International Federation of Organic Agriculture Movements para nortear o sistema de produção, exigindo a eliminação do uso de fertilizantes sintéticos de alta solubilidade e agrotóxicos, visando à conservação e a melhoria da estrutura e fertilidade do solo e o equilíbrio do agroecossistema.
- Rainforest Alliance: envolve preservação ambiental, bem estar dos trabalhadores e interesses das comunidades locais. Não proíbe o uso de produtos químicos, mas exige manejo integrado de pragas, manutenção da cobertura arbórea e restauração da vegetação nativa.
- Utz Kapeh: compreende práticas agrícolas adequadas para a produção de café e para o bem estar dos trabalhadores, incluindo o acesso à saúde e à educação. Ressalta mais a produção responsável do que a agricultura sustentável.
- Amiga das aves (bird friendly): exige a produção orgânica e sombreada por cobertura florestal, visando proporcionar um habitat favorável às aves.
O 4C´s é uma iniciativa conjunta dos importadores, exportadores, indústria, alianças de negociantes, Organizações Não Governamentais - ONG´s - sociais e ambientais e produtores de café, para desenvolver um código global de conduta objetivando a sustentabilidade social, ambiental e econômica da produção, pós-colheita e comercialização da maior parte do café verde.
Já o PIC pode ser definido como um sistema de manejo holístico da produção de café, cujos objetivos incluem os princípios básicos da agricultura sustentável (VAN RAIJ, 2003). Está em fase de regulamentação e há indícios de que poderá vir a ser aceito pelo 4C´s.
No Brasil há também a certificação da Brazilian Specialty Coffee Associatio - BSCA, a qual adota em seu esquema de certificação o Sistema de Gestão Sócio-Ambiental para a produção de cafés especiais, compartilhando princípios comuns de sistemas de gestão com a série de normas NBR ISO 9000 e NBR ISO 14001 e a BSI OHSAS 18001 para sistemas de qualidade, de meio ambiente e de saúde e segurança ocupacional, respectivamente, além de requisitos de boas práticas agrícolas (GAP) baseados nas normas EurepGap e Utz Kapeh.
Nos últimos anos, a indústria de café e alguns produtores, particularmente as grandes propriedades, também têm procurado diferenciar a qualidade de seus produtos através das certificações ISO 14001 e ISO 9001.
Além desses programas de certificação, existem iniciativas de certificação associando origem e qualidade ao setor cafeeiro (Souza, 2006), como ocorre com os vinhos certificados por origem na França.
Essas iniciativas são originárias das exigências do próprio mercado - origem dos grãos, fazendas, regiões ou portos de embarque - e da necessidade da definição de padrões de comercialização de um produto sujeito a especulações e variações de qualidade. Recentemente essas iniciativas se transformaram em estratégia de diferenciação de cafés especiais. Tentativas formais de indicações geográficas para valorizar a qualidade associada à origem dos cafezais são ainda muito recentes no mundo todo.
A Lei brasileira no 9.279/96 estabelece dois tipos de indicações geográficas: Indicação de Procedência e Denominação de Origem. Indicação de procedência se refere ao nome do país, cidade da região ou localidade do seu território, conhecido como centro de extração, produção ou fabricação de determinado produto ou prestação de serviço. Na denominação de origem, o nome designa produto ou serviço cujas características ou qualidades se devam exclusiva ou essencialmente ao meio, incluindo fatores naturais e humanos.
As indicações geográficas estão entre as soluções para ampliar e estabilizar as margens de lucro, principalmente na produção em pequena escala em regiões delimitadas (Chaddad, 1996). As indicações de procedência permitem associar a qualidade do produto à região onde foi produzido e as denominações de origem permitem associar o produto às tradições culturais.
Segundo Souza (2006), a falta de regras específicas para promoção da origem, como padrões na classificação oficial, e de ações coordenadas e complementares para sua valorização, refletem a importância da definição dos direitos de propriedade. O pequeno apoio ao fortalecimento das indicações geográficas e de objetividade na exposição da origem aos consumidores, principalmente quando a qualidade está associada ao território, pode se constituir em fonte de perda de valor.
Notas dos autores:
Parte deste artigo origina-se de: Consumers International, From bean to cup: how consumer choice impacts upon coffee producers and the environment, London, Consumers International, 2005.
2 Comércio justo (fair trade) se refere em termos gerais à honestidade no comércio e não implica um processo de certificação e é o termo usado no sistema de selo da Fairtrade Labelling Organizations International (FLO), enquanto a Marca FAIRTRADE é marca de comércio registrada. Produtos fairtrade se referem especificamente a produtos com a Marca FAIRTRADE (Consumers International, 2005, p. 4).
Referências bibliográficas
Abic - Associação Brasileira da Indústria do Café, https://www.abic.com.br. Março 2006
Chaddad, Fabio R. Denominações de origem controlada: uma alternativa de adição de valor no agribusiness. São Paulo: FEA/USP, Dissertação de Mestrado, 1996. 106p.
Conab - Companhia Nacional de Abastecimento. Safra 2006/2007. Dezembro 2005.13p.
Pedini, Sérgio. Comunicação pessoal, agosto 2005.
Souza, M. C. M. Indicações Geográficas de Produtos Agropecuários: o caso do café. IEA, 18 jan. 2006 https://www.iea.sp.gov.br/out/verTexto.php?codTexto=4511