A partir disso, surgiu o desafio: escrever um artigo em que fosse discutida a construção das curvas de resposta. Logo de início, a pergunta: seria possível transferir esse conhecimento aos produtores? Sim, em parte. E outra: os produtores seriam beneficiados ao construir suas próprias curvas de resposta? Sim, enormemente.
A construção de curvas de resposta (calibração) é um trabalho de pesquisa elaborado, que envolve tanto o conhecimento do solo e da planta, quanto o conhecimento da dinâmica dos fertilizantes no meio. Transferir esse conhecimento, numa linguagem e num formato que o produtor possa entender e utilizar, é o grande desafio que se faz presente.
Mas por que uma curva? Para respondermos a essa pergunta, temos que entender uma das Leis da Fertilidade do Solo: A Lei de Mitscherlich. Essa Lei, também conhecida como Lei dos Incrementos Decrescentes, postula que, "Quando se aplicam doses crescentes de um nutriente, o aumento na produção é elevado inicialmente, mas decresce sucessivamente". Mitscherlich observou que, elevando progressivamente as doses do nutriente deficiente no solo, a produção aumentava rapidamente no início. Entretanto, esses aumentos tornavam-se cada vez menores, tendendo a formar um "platô" de resposta, onde a produção não aumentava, mesmo com a elevação da dose do nutriente. A figura abaixo mostra graficamente esta lei:
Quando não aplicamos o nutriente (D0), conseguimos uma produção irrisória. Ao elevar a dose aplicada, a produção vai aumentando de forma linear, até atingir a dose D1 (Região A). A partir desse ponto, as respostas à adição do nutriente são cada vez menores, até que a produção não aumenta mais, mesmo com a aplicação de grande quantidade de nutriente (Região B). A partir da dose D2, as quantidades ficam tão elevadas que ocorre efeito negativo do nutriente e a produção começa a diminuir (Região C), formando a famosa "curva de resposta".
Essa Lei demonstra que, na prática, devemos trabalhar na Região A, também chamada de região de elevada probabilidade de resposta. A dose D1 é aquela de maior eficiência econômica. Essa é a dose a ser aplicada. Doses muito acima desta, certamente trarão prejuízo. Não adianta aplicar fertilizante indefinidamente. Esse é um erro comum e que, na maioria das vezes, é difícil de ser notado. Se aplicarmos uma dose intermediária entre D1 e D2, elevada produção será atingida, mas com um gasto muito maior do que o necessário.
Aparentemente parece simples, mas, obviamente, na pesquisa científica, até chegarmos às doses recomendáveis, temos que utilizar ferramentas refinadas da estatística, tentando uma maior aproximação da realidade. Entretanto, o produtor, com organização e capacidade de observação, pode construir uma boa curva de resposta, aproximando-se muito da dose mais adequada para sua lavoura.
Para o produtor, a construção da curva de resposta só será eficiente para o nitrogênio. Isso porque, além do nitrogênio não ser determinado em análises de solo de rotina, podemos considerar que este nutriente não se acumula nos solos, sendo a dose recomendável dependente, apenas, da produção esperada. Dessa forma, a dose selecionada poderá ser utilizada nos anos seguintes. No caso de fósforo e potássio, ocorre relativa acumulação desses nutrientes nos solos, não permitindo que a dose selecionada para um ano possa ser utilizada nos anos posteriores. Para esses últimos, a dose recomendável deve levar em consideração os teores desses nutrientes disponíveis no solo.
Construção da Curva de Resposta
Em uma lavoura homogênea (plantas da mesma variedade e da mesma idade, no mesmo espaçamento, em solo com as mesmas características perceptíveis: cor e textura; barrento ou arenoso), iremos demarcar seis pequenos talhões, contendo, cada um, 60 plantas. Em cada um desses talhões, será aplicada uma dose diferente de nitrogênio. Para facilitar a transposição para cada situação real, as doses serão apresentadas em gramas de nitrogênio, por planta, por ano (g/planta/ano de N).
A sugestão que faço, para café arábica, é a seguinte: 18, 36, 54, 72, 90 e 108 g/planta/ano de N. Essas doses serão parceladas em três ou quatro aplicações durante o período chuvoso, ou seja, serão divididas por três ou quatro, de acordo com o número de parcelamentos. Cada um dos seis talhões receberá uma dessas doses na forma de uréia (40; 80; 120; 160; 200 e 240 g/planta/ano de uréia), que não apresenta outro nutriente além do nitrogênio. Os demais tratos culturais e as aplicações dos outros nutrientes devem ser, rigorosamente, as mesmas nos seis talhões.
Seguindo esse roteiro, é de se esperar que a produção nos talhões seja diferenciada, apresentando, aproximadamente, a mesma forma de resposta proposta por Mitscherlich. Já no primeiro ano podemos ter uma idéia da forma de resposta, mas apenas com a média de três ou quatro produções podemos estabelecer as reais diferenças entre as doses testadas.
Exemplificaremos da seguinte forma: as três primeiras doses testadas (18, 36 e 54 g/planta/ano de N) proporcionam produções crescentes, mas menores do que as doses de 72 e 90 g/planta/ano de N. Essas doses, por sua vez, proporcionam produções equivalentes entre si, mas maiores do que a produção proporcionada pela dose de 108 g/planta/ano de N, o que forma uma curva de resposta característica. Assim, é fácil decidir pela dose de 72 g/planta/ano de N, que gera uma produção tão elevada quanto a dose de 90 g/planta/ano de N, mas com economia de recursos. Para nos aproximarmos, ainda mais, da dose mais econômica, devemos aplicar um fator de redução de 10% à dose selecionada. Assim, a dose "ideal" seria: 72 x 0,9 = 65 g/planta/ano de nitrogênio. Tendo selecionado a dose "ideal" de nitrogênio, esta poderá ser aplicada ano após ano, em toda a lavoura, visando à obtenção da produção máxima em função do nitrogênio aplicado.
É importante ressaltar que, a curva de resposta gerada para nitrogênio será específica para determinadas doses dos outros nutrientes, especialmente fósforo e potássio. Assim, se as doses de fósforo e potássio mudarem de um ano para outro, a curva de resposta para nitrogênio será diferente. O que podemos fazer é definir doses adequadas de fósforo e potássio para que sejam atingidas elevadas produções e, fixando essas doses, proceder à construção da curva de resposta para nitrogênio. Com o passar do tempo, as doses de fósforo e potássio tendem a mudar, de acordo com os teores no solo. Mas isso não importa muito, desde que as futuras doses sejam adequadas para se atingir a produção anteriormente estabelecida.
Em curto espaço de tempo, podemos repetir o pequeno experimento novamente, visando confirmar seus resultados ou aprimorá-los, variando as doses testadas.
Serão naturais críticas resultantes da forma simplificada como foi apresentado o método de calibração, ressaltando, inclusive, alguns pequenos equívocos que fomos forçados a cometer, visando, unicamente, facilitar a adoção da tecnologia. Mas, mesmo assim, nos parece inequívoca a economia de recursos que pode ser gerada por essa tentativa de aproximar os produtores das tecnologias de ponta.