Essa situação aparentemente contraditória foi fruto do crescimento elevado dos tributos no mesmo período, o que impediu que sua provável maior eficiência produtiva gerasse ganhos em termos de rentabilidade para o negócio.
Além desses dados, as técnicas de análise de balanços podem trazer muitas outras informações importantes para que os diversos interessados na avaliação da situação econômico-financeira da cooperativa - associados, credores, governo, etc. - possam determinar sua postura diante dela.
Por exemplo, os indicadores de liquidez, calculados a partir da comparação de valores do balanço patrimonial, demonstram que a entidade teve queda significativa em sua capacidade de liquidação das obrigações assumidas (Figura 1).
Figura 1 - Indicadores de liquidez
Na comparação entre o dinheiro disponível na cooperativa (caixa, conta-corrente bancária e aplicações financeiras de livre movimentação) e suas dívidas de curto prazo (Passivo Circulante), explicitada pelo quociente denominado Liquidez Imediata, percebe-se que a organização possuía, em 2001, R$ 0,83 para cada R$ 1,00 de exigibilidade. Já em 2005, esse quociente caiu para R$ 0,06 para cada R$ 1,00.
Da mesma forma, considerando os direitos a receber e as disponibilidades que a cooperativa apresenta (Liquidez Seca), sua capacidade de liquidação de dívidas de curto prazo, que era de R$ 1,66 para cada R$ 1,00 de dívida em 2001, caiu para R$ 0,22 em 2005.
Em outras palavras, se todos os seus títulos de crédito (duplicatas, aplicações financeiras com prazo fixo, etc.) fossem revertidos em dinheiro e somados às disponibilidades, não se obteria montante suficiente para liquidar nem um quarto de todas as obrigações que vencem em prazo máximo de um ano.
A mesma situação é verificada quando se comparam todos os investimentos de curto prazo da cooperativa, inclusive os estoques, com suas obrigações no mesmo período (Liquidez Corrente). De quase R$ 4,00 de recursos para cada R$ 1,00 de dívida em 2001, verificou-se que a entidade passou a ter, praticamente, a mesma proporção de obrigações e direitos em 2005.
Talvez esses indicadores não sejam de todo ruim, uma vez que não há referência para comparação. O que preocupa é a tendência de queda vertiginosa apresentada nos últimos anos. Até que ponto a redução dos índices de liquidez da cooperativa é resultado de ações planejadas? Quais os principais fatores que estão por trás da queda das condições de solvência da instituição?
A análise dos dados financeiros permite, apenas, identificar questões que trazem preocupação ou que indicam bom desempenho por parte da organização. A partir desse ponto, informações qualitativas devem ser buscadas para que se possa encontrar as causas das constatações explicitadas pelos indicadores.
No caso da cooperativa em estudo, a piora nos indicadores de liquidez de curto prazo está associada a uma redução considerável em suas obrigações de longo prazo e ao conseqüente incremento de suas dívidas exigíveis no período máximo de um ano, conforme pode ser observado pela evolução desses grupos de contas no Balanço Patrimonial e do indicador de Composição do Endividamento (Figura 2).
Figura 2 - Indicadores de Garantia de Capitais
Esse quociente compara o passivo circulante com o total de obrigações que a entidade possui. Percebe-se que as exigibilidades de curto prazo, que representavam, aproximadamente, 26% do total em 2001, passaram para quase 98% em 2005.
Porque a cooperativa incrementou suas obrigações de curto prazo, reduziu seu endividamento de longo prazo e, consequentemente, viu deteriorada sua condição de solvência? Questões como essa deveriam ser abordadas pela administração em assembléia. Os associados têm o direito de ser informados sobre os motivos que levaram a tal situação.
Nesse ponto, o papel do Conselho Fiscal se torna ainda mais relevante, pois seus integrantes representam todo o quadro social e, entre muitas outras, tem a obrigação de, à luz da análise de balanços, alertar os cooperados sobre possíveis elementos que possam trazer riscos à integridade financeira da instituição.
Os demais indicadores apresentados na Figura 2 explicitam que a cooperativa utilizou algo em torno de 60% de capitais de terceiros nos últimos anos, ou seja, que seus recursos próprios (capital social, sobras não distribuídas, reservas legais, etc.) giraram em torno de 40% dos investimentos, sendo que 88% desses foram utilizados, em 2005, no financiamento do ativo imobilizado, sem muita variação em todo o período.
Além dos indicadores de liquidez e de garantia de capitais, os quocientes de rentabilidade também são de extrema importância na avaliação das condições econômico-financeiras de uma empresa.
Mesmo no caso de cooperativas, em que a preocupação maior é a transferência de benefícios aos associados, o rendimento do negócio em si não pode ser relegado a segundo plano.
Sobretudo em função da dificuldade de capitalização dessas organizações, a geração de sobras e sua acumulação é fator preponderante para prestação de serviços eficientes ao quadro social e, consequentemente, para continuidade do negócio.
Concomitantemente, os atuais mercados altamente competitivos em que atuam exigem que o processo de acumulação de capital seja constante para que se acompanhe o ritmo do desenvolvimento tecnológico. Sem isso, a entidade estaria fadada ao insucesso ou à crescente necessidade de amparo por parte do poder público.
Dentre os indicadores de rentabilidade, aquele que informa o rendimento alcançado pelo total de recursos próprios (Patrimônio Líquido) é o que melhor retrata a situação financeira da instituição. No caso da cooperativa em análise, o retorno obtido com a utilização desse capital foi, em média, de 3,27% a.a. no período de 2001 a 2005 (Figura 3).
Figura 3 - Indicador de Rentabilidade do Patrimônio Líquido
Mais uma vez, não se pode qualificar esse valor como bom ou ruim de imediato. Algumas questões devem ser levadas em consideração para que se chegue à conclusão sobre o assunto.
Em primeiro lugar, não há informações sobre a média de rentabilidade dos demais tipos de empresas que atuam na mesma região e no mesmo ramo de atividade. Essa informação seria relevante para que fosse possível posicionar a cooperativa em um ranking e, consequentemente, classificar seu desempenho.
Em termos de referência, o máximo que poderia ser feito é comparar o valor apresentado com a rentabilidade de algum ativo financeiro no período. Com certeza, nesse caso, o rendimento médio de 3,27% a.a. seria bem inferior a qualquer tipo de investimento com baixo risco no mercado financeiro.
Em segundo lugar, conforme já comentado anteriormente, a rentabilidade de uma organização cooperativa pode ser baixa - desde que seja suficiente para garantir sua competitividade - em função de sua necessidade de transferir o máximo de benefícios a seu quadro social.
Enquanto uma sociedade de capital trata com seus fornecedores, muitas vezes, de forma predatória, a cooperativa agropecuária em questão tem nesses agentes seus próprios donos e usuários. Assim, seria incoerente para uma instituição desse tipo pagar preços menores pela matéria-prima com o intuito de garantir maior rentabilidade ao negócio, uma vez que estaria prejudicando àqueles que, por razões óbvias, deveriam ser os maiores beneficiados com sua atuação.
Por fim, a falta de informações qualitativas pode levar a conclusões equivocadas sobre as condições de rentabilidade do negócio. A cooperativa pode ter passado, no período em análise, por um processo de intensos investimentos que, durante sua realização, tiveram efeito negativo sobre sua capacidade de gerar sobras.
Entretanto, a partir da maturação desses investimentos, enormes ganhos estariam sendo esperados em termos de participação no mercado e prestação eficiente de serviços ao quadro social, o que compensaria o esforço realizado inicialmente. Os indicadores de rendimento, por serem estáticos, não captam essas variáveis.
Pelo que se observou em relação à composição do endividamento, contudo, não se percebe nenhum indício de que isso possa ser a causa da baixa rentabilidade, uma vez que as obrigações de curto prazo foram incrementadas em detrimento das de longo prazo, mais apropriadas para financiamento de projetos com retorno demorado.
Todas essas informações devem ser analisadas em profundidade pelos responsáveis pela administração da entidade e repassadas, de forma clara e objetiva, aos cooperados.
Os conselhos de Administração e Fiscal têm o dever de conhecer a realidade financeira de sua organização e, a partir das diversos dados gerados pelas técnicas de análise de balanços, tomar as decisões para garantir o sucesso do negócio.
Logicamente, a administração financeira não compreende o universo de informações necessárias para o processo administrativo. Contudo, não deixa de ser instrumento muito útil para alcance dos objetivos, sejam eles sociais ou econômicos, de qualquer empreendimento.