São 79 imóveis que poderão ser vendidos pelo Estado de São Paulo, caso o Projeto de Lei Nº 328, de 2016, seja aprovado. No texto, assinado pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB), constam propriedades como o Centro Avançado de Pesquisa Tecnológica Agronegócio e Engenharia e Automação, de Jundiaí, que desenvolve pesquisas e presta serviços tecnológicos nas áreas de mecanização agrícola e de pós-colheita, e realiza estudos sobre o impacto das atividades antrópicas sobre o ambiente, além de área pertencente ao Instituto Biológico – Centro Experimental Central, em Campinas. O PL foi enviado à Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) no dia 14 de abril.
No Projeto de Lei, o governador afirma que trata de “bens imóveis inservíveis ou de pouca serventia (...) tanto os imóveis que não estejam sendo utilizados pelo Estado como aqueles que, ainda que utilizados total ou parcialmente, não interesse mais à Administração Pública mantê-los no acervo patrimonial, ante a possibilidade de as repartições públicas lá localizadas serem transferidas para outros imóveis, sem prejuízo da qualidade do serviço prestado”.
A tese contraria as manifestações de pesquisadores que encaram a alienação dos imóveis como comprometedora para a produção científica em São Paulo e procedimento adotado pelo governador de São Paulo como autoritário. “Existem procedimentos que não foram observados. Um deles, o mais básico, seria a consulta aos usuários dessas propriedades. Não houve consulta e nem comunicação por parte dos superiores aos pesquisadores. Estão passando por cima da Constituição Estadual de São Paulo que no seu artigo 272”, alertou o presidente da Associação dos Pesquisadores Científicos do Estado de São Paulo – ApqC, Joaquim Adelino Azevedo Filho.
O referido artigo afirma que:
“O patrimônio físico, cultural e científicos dos museus, institutos e centro de pesquisa da administração direta, indireta e fundacional são inalienáveis e intransferíveis, sem audiência da comunidade científica e aprovação prévia do Poder Legislativo”
“Assim estamos contatando os parlamentares para discutir o projeto, bem como respeita a constituição, ouvindo a comunidade científica. Colocamos emendas parlamentares e estamos contatando os deputados para apoiar. Os usuários para nos apoiar na defesa do interesse maior que a geração do conhecimento”, explicou Azevedo Filho.
Segundo o próprio secretário de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, Arnaldo Jardim, a proposta já foi discuta com a pasta. “O pacto que nós temos a firmar com o governador é que, dentro de um patrimônio muito grande que tem a Secretaria de imóveis, vamos focar em zonas urbanas ou as pesquisas mudarem. Então, nenhuma área de pesquisa vai ser comprometida, nenhum programa vai ser interrompido e os recursos advindos dessa venda serão utilizados para o fortalecimento do nosso setor”, afirmou o Jardim, durante o evento Sabor da Colheita, que celebrou a abertura da colheita de café no estado, nesta quarta-feira (25/5).
No entanto, em resposta ao governador, a Associação dos Pesquisadores do Estado de São Paulo vem se mobilizando em diversas áreas para buscar barrar a proposta. “O PL328, coloca 79 imóveis em tela, mas se aprovado como está o artigo 11 dá ao governador carta branca para dispor de imóveis menores de 5000m2, e maiores poderá fazer transferência para outro ente público ou Parceria Público Privado PPP”, afirmou Azevedo Filho.
Os pesquisadores vem realizando manifestações como a de hoje, no evento Sabor da Colheita, onde seguraram cartazes expondo a possibilidade de venda de áreas de pesquisa ativas. Além de pleitos em eventos, circula entre o setor uma petição on-line com mais de 3 mil assinaturas que pede que cidadãos manifestam-se contrários ao Projeto de Lei Nº 328.
Culturas estudadas nas unidades paulistas
Segundo o presidente da Associação dos Pesquisadores Científicos do Estado de São Paulo, muitas unidades ameaçadas não trabalham com apenas uma cultura. “Mesmo as que têm uma cultura principal, como Piracicaba, que é a cana-de-açúcar, tem pesquisas de conservação de solo, uso de resíduos. Em Brotas há criação de aves e pastagens sobre Cerrado. Em Ribeirão Preto há criação de gado leiteiro e uma pesquisa inédita sobre o leite biofortificado para crianças e idosos”, pontua.
Joaquim Adelino Azevedo Filho lembra, ainda, que algumas das unidades foram pioneiras em desenvolver tecnologias para o café. “Em Gália, entre as que estão em tela, é a única que têm pesquisa com café e em consórcio com macadânia”, aponta. “Jundiaí tem o centro de mecanização, que teve importância fundamental para o protótipo das diversas colheitadeiras de café da atualidade, bem como a derriçadeira manual, cujo centro importou e adaptou a tecnologia usada na colheita de azeitona na Europa. Bem como outros equipamentos utilizados na cultura do café para tratos culturais e pulverizações”.
“Já existem ameaças em Unidades que trabalham mais com café. Como Mococa, onde a prefeitura está com um processo pedindo doação de metade da Fazenda, que tem cultivo de café, para destinar a um parque industrial. Em Campinas, a coleção de café está numa área que está para ser desapropriada. Caso o artigo 11 seja aprovado, isso pode acelerar”, alerta o pesquisador.
Os prejuízos às pesquisas em andamento caso os imóveis sejam alienados, alertam os estudiosos, seriam incalculáveis. “Existe o prejuízo direto da infraestrutura (física e histórica), laboratórios construídos ao longo de anos com financiamentos públicos, é impossível mudar muitas estruturas, e o tempo que levará para construir algo semelhante para continuidade é praticamente remoto, se está vendendo para fazer dinheiro.... é bem provável que muitas pesquisas sejam encerradas. Outras que estão em andamento não serão concluídas e terão que voltar a estaca zero como as áreas com estudo de cana crua”.