Por Natália Camoleze
Na última sexta-feira (31/03) tivemos o prazer de acompanhar a visita da CEO da Fairtrade Global, Sandra Uwera, à loja da Ben & Jerry's, na Oscar Freire, em São Paulo (SP). A marca utiliza ingredientes com certificação Fairtrade e destaca que apoia um movimento global que trabalha para garantir que pequenos agricultores de países em desenvolvimento consigam sobreviver no competitivo mercado global.
Sandra Uwera, CEO da Fairtrade Global - Foto: Julio Huber/Nova Comunicação
Sandra é de Ruanda, cresceu ali e no Quênia. Possui um Master of Science (MSc) em Planejamento Estratégico, um Bacharel em Comunicações Corporativas e realizou treinamento profissional avançado em política e direito de comércio internacional, inclusão digital e liderança para a sustentabilidade dos negócios. Ela faz parte de vários conselhos na África e internacionalmente.
Segundo ela, foi uma grande alegria quando recebeu a proposta para CEO da Fairtrade. “Fiquei muito feliz em representar uma organização tão nobre, principalmente pelos valores muito fortes, que envolvem promoção e boas condições para os produtores, considerando justiça social num nível global, com a certeza de que os produtores sejam ouvidos. Posso representá-los em reuniões e lutar por condições melhores’’.
Sandra chega ao Comércio Justo com uma vasta experiência na África e traz um conjunto único de habilidades, perspectivas e relacionamentos. Recentemente, atuou como CEO do COMESA Business Council (CBC), organização de membros empresariais na África, que é uma instituição do setor privado do Mercado Comum para a África Oriental e Sul (COMESA), que representa 34 setores empresariais em 21 países.
Foto: Julio Huber/Nova Comunicação
Fairtrade International é uma organização global que trabalha para garantir melhores condições de trabalho para fazendeiros e operários através do Comércio Justo, que é um modelo comercial que coloca o ser humano e a sustentabilidade social, econômica e ambiental das sociedades no centro, dignificando o trabalho, respeitando o meio ambiente e promovendo uma gestão responsável e sustentável dos recursos naturais. Se baseia em relações comerciais nas quais existem solidariedade, equidade e justiça, e, definitivamente, contribui para a melhoria das condições de vida das famílias produtoras e trabalhadoras em todo o mundo.
Em relação ao café brasileiro, Sandra destaca que o Brasil, como maior exportador de café, traz o desafio do custo de produção. “Com as crescentes condições econômicas em todo o mundo, vimos muitos produtores sofrerem em termos de altos custos de negócios. Vimos cair os preços do café que eram muito fortes no início dos anos 2000. Vimos os desafios de nossos clientes deixarem de comprar café por causa do poder aquisitivo fraco, com menos dinheiro no bolso, e o café sempre foi vendido como um produto de alto valor. E a parte boa é que é um produto que não sairá do mercado, sempre haverá demanda’’, explica.
Mas a CEO completa que isso não reflete como os produtores estão se saindo no campo: “A gente descobre que muitos produtores estão operando dentro de sistemas e processos de altos impostos. Eles estão enfrentando desafios em termos de instalação das plantas e de processamento correto. Tenho certeza de que alguns dos desafios que você enfrenta em termos de como você limpa seu café, por exemplo, pode ser atualizado’’.
O objetivo com o comércio justo é melhorar as condições de operação dentro dos setores e esse também é o caso do Brasil. Sandra aponta que ainda é muito importante que as empresas maiores sejam fornecedoras e que hoje os produtores estão mais atentos a investir nas instalações, nas facilidades operacionais, nas tabelas salariais, nos salários que todos os requisitos que podem ajudar este setor a se tornar mais lucrativo dentro do comércio justo.
“É muito interesse em garantir que esse setor que você conhece seja fortalecido e cresça na perspectiva dos produtores. São muitos os desafios, como a mudança climática, instalações precárias e operacionais, e é por isso que recentemente aumentamos nosso preço mínimo para café orgânico e café lavado, para que possamos criar uma rede de segurança para os produtores, para que não sejam afetados por todos os problemas”.
Em relação ao Brasil, o que mais a impressionou foi a riqueza em termos de agricultura. “É um país lindo, com pessoas muito engajadas e dedicadas em melhorar sua produção”. Sandra e equipe visitaram também a Coperfam - Cooperativa de Laranja e puderam acompanhar a produção e todo o processo de comercialização da fruta.
Foto: Julio Huber/Nova Comunicação
Mulheres na produção
Quem também acompanhou essa visita foi a produtora e presidente da Cooperativa dos Agricultores Familiares de Poço Fundo e Região (Coopfam), Vânia Lucia Pereira da Silva, que destaca que a cooperativa foi uma das primeiras a ter o certificado Fairtrade.
O movimento na região começou na década de 80, quando os produtores já tinham um café orgânico, mas sem muita ideia do que era isso. “Com muita pesquisa e trabalho, foram percebendo e entendendo sobre o café, até que viram que podiam certificar e assim veio a Fairtrade, todo um novo trabalho e a criação de uma associação de pequenos agricultores familiares da região’’, conta Vânia.
Vânia Lucia Pereira da Silva, produtora e presidente da Cooperativa dos Agricultores Familiares de Poço Fundo e Região (Coopfam) - Foto: Coopfam
A Coopfam foi criada em 2003 e busca qualidade de vida, respeito e preservação da natureza, sem agrotóxico. “Hoje somos aproximadamente 500 cooperados e mais de 90% do nosso café é exportado para 14 países’’, conta Vânia.
Ela destaca que a mulher foi conquistando cada vez mais espaço: “Já tínhamos um papel em todo o processo, menos na comercialização. Até que uma mulher ficou viúva e teve que ir numa assembleia sozinha, com muitos homens. Então, as mulheres foram dar uma força para ela e perceberam que tinham que estar nesse espaço também. Começaram a se organizar, formando o grupo MOBI - Mulheres Organizadas em Busca de Igualdade, em 2006, e aí veio o trabalho de diagnóstico com esposa dos cooperados, para entender como estavam. Hoje temos um processo de conscientização e transformação do grão à xícara’’.
Vânia, que também é produtora de café, fez parte deste processo de construção coletiva. Primeiro, ela ocupou um dos espaços de coordenação da Rede Orgânicos Sul de Minas, com o projeto das rosas orgânicas. Dentro da Coopfam, ela foi indicada para a chapa da diretoria em 2016, pelo grupo MOBI, para concorrer à diretoria. Foi uma surpresa para ela quando esteve restrita ao grupo menor indicado para votação para diretoria. “Uma mulher assumir a presidência de uma cooperativa de café realmente é histórico. Eu participo de várias reuniões e busco saber se há mulheres presidentes de cooperativas de café e acho que sou pioneira nessa questão aqui em Minas Gerais”, contou.