Branding, exportações, estratégia são alguns dos termos mais usados pelo empresário, produtor e exportador de grãos orgânicos e biodinâmicos pela Fazenda Camocim, conhecida pelo Jacu Coffee, cujos lotes são obtidos a partir das fezes dos jacus, pássaros com apetite para as melhores cerejas de café (confira aqui mais informações).
O carioca Sloper, que assumiu o cargo no dia 6, formou-se em administração e business pela University of California, de Los Angeles (UCLA). "Não venho da cafeicultura, não herdei fazenda da família, não tenho de contentar o pai. Meu olhar é empresarial, tudo foi feito com pesquisa", diz.
Leia abaixo entrevista com Henrique Sloper*:
Este é um bom momento do café para assumir a presidência da BSCA?
Henrique Sloper: Já me perguntei várias vezes. Mas acho que é um bom momento, sim. A cafeicultura especial está crescendo e a BSCA está pronta para isso. Temos suporte da Apex (Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos) e do Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas) para promover eventos. É uma fase em que vamos investir em branding no Brasil. Além disso, nosso principal concorrente, a Colômbia, passa por sérios problemas de qualidade e de produção. Essa é mais uma oportunidade, pois os torrefadores internacionais já dependem do Brasil: 35% dos grãos verdes são nossos.
Tivemos boas colocações em campeonatos mundiais de baristas em 2012. Para o senhor, isso ajuda a cultura do café especial?
H.S.: Tem um peso importante, mas deveria estar melhor. Deveríamos investir mais na formação desses profissionais, pois precisamos de gente competente para mostrar o café brasileiro. Nós da BSCA damos suporte, mas nosso foco é o café verde. É missão do varejo brasileiro investir, pois a maioria dos baristas ainda é apenas um operador de máquina. O barista deveria atuar como o sommelier, conhecendo todo o processo, desde a lavoura. E transmitir isso para o cliente.
É possível observar no mercado nacional uma valorização dos microlotes. Essa é uma tendência que deve ser preservada?
H.S.: Sim, é irreversível. O café como produto de gastronomia passa pelos microlotes: é um nível de detalhe necessário para uma abordagem gastronômica. Estamos também atendendo uma demanda de microtorrefadores, que buscam grãos muito especiais. Além disso, conseguimos com o microlotes mostrar o trabalho do produtor. É um mercado que merece atenção: o consumidor final ainda não faz ideia do quão trabalhoso é obter uma boa xícara de café, o quanto isso demanda da lavoura, da torra. E ainda pode um barista estragar tudo no final. Veja o caso dos restaurantes. Em muitos deles o café é intragável e poderiam investir em microlotes. Há muito espaço ainda.
Dois novos territórios receberam a certificação de Indicação Geográfica -IG. Há mais iniciativas?
H.S.: É um processo complicado, burocrático demais no Brasil. Mas há vários em andamento no Brasil, em Minas Gerais e São Paulo. Em breve, novas certificações devem ser anunciadas. Mas não basta. A IG indica que naquela área há produtos de qualidade, mas estamos em uma nova fase. Queremos mostrar quem é o produtor e valorizar o grão.
E em relação à proibição de importação de café verde?
H.S.: Esse é um assunto delicado. Vamos ver um ´boom´ do café especial brasileiro, de valorização do produto, é uma fase de transformação. Mas sou a favor de um dispositivo seletivo.
Temos, sim, de proteger o Brasil do robusta cultivado em grande quantidade, com auxílio de políticas sociais, que dão mudas e fertilizantes de graça aos produtores. Com eles, não há como competir. Mas é um protecionismo burro não permitir a entrada de cafés verdes especiais, o topo da pirâmide. Estamos prejudicando a educação do brasileiro, nos distanciando do primeiro mundo. Precisamos deixar entrar o que é interessante para conhecermos, acabar com a falta de informação. Um dos reflexos disso está no nosso trabalho de torra, ainda primário. Por isso, sou a favor dessa proteção seletiva: diversidade é positiva e ajuda o mercado.
Embora haja ainda muita restrição ao robusta, têm surgido algumas iniciativas de grãos especiais. Qual a sua opinião?
H.S.: Robusta é um café de blend e, honestamente, até bem pouco tempo eu mesmo tinha bastante preconceito. Mas há boas iniciativas, especialmente no Espírito Santo, e confesso que tenho me surpreendido. Mas não sei ainda como esses robusta especiais se encaixariam na estratégia da BSCA. Embora já seja uma realidade.
Chamou atenção este ano o grande número de grãos mineiros entre os primeiros colocados do Cup of Excellence. As demais regiões produtoras não deveriam ter mais espaço?
H.S.: Haverá mudanças, tudo deve ficar mais democrático. Queremos mostrar o Brasil com suas regiões, suas diferenças. Mas Minas ainda é o motor, produz os melhores cafés do mundo, tem tecnologia e pesquisa. E se inscrevem mais nos concursos de qualidade. Mas a metodologia do concurso está sendo revista, sim. Há uma questão de ´calibragem´, de educação dos juízes para que eles reconheçam outros bons grãos. Eles chegam aqui buscando notas de chocolate, de caramelo. E se deparam com produtos que têm acidez semelhante ao de um café africano.
Quais são os projetos da BSCA para os próximos dois anos?
H.S.: Primeiro, ter uma atuação mais forte nas exportações e, para isso, reforçar a marca do café brasileiro no exterior. Queremos ampliar ainda nossa participação em países como China, Coreia do Sul e Austrália. Vamos participar de muitos eventos, feiras, campeonatos de baristas, apresentando salas de cupping. A projeção da BSCA é de que as exportações de cafés especiais devam gerar uma receita entre 600 milhões e 650 milhões de dólares em 2013.
*Entrevista concedida ao Estadão.
As informações são do Estadão, adaptadas pelo CaféPoint.