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FairTrade: certificação ou movimento?

POR ULISSES FERREIRA DE OLIVEIRA

ULISSES FERREIRA

EM 03/08/2016

3 MIN DE LEITURA

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Quem acompanha a coluna FairTrade, no portal CaféPoint, pode ter se perguntado: por que ao mencionar o FairTrade sempre procuro utilizar a palavra movimento? Movimento FairTrade, movimento de Comércio Justo, movimento de cidades de comércio justo e solidário! E que poucas vezes utilizo a palavra certificação. Ficou curioso? Qual a diferença? O que desejo transmitir com isso? Qual é o certo?

Sempre que vamos falar com técnicos, consultores e compradores de produtos FairTrade, vejo que estes utilizam a expressão certificação FairTrade e, por outro lado, ao conversar com produtores e pessoas engajadas escuto a palavra movimento.

Na verdade prefiro utilizar a expressão movimento FairTrade, por entender que a certificação de produtos, das propriedades, das cooperativas e associações não é o objetivo principal do FairTrade. O seu objetivo não é dar ao consumidor um produto com rastreabilidade garantida por uma certificação sócio ambiental. O seu objetivo principal é a transformação de comunidades exploradas, por relações comerciais injustas, em comunidades capazes de se auto organizar e, assim, se desenvolver enquanto agricultores e cidadãos. Para isso o Movimento FairTrade faz uso de um sistema de certificação auditável o que confere ao movimento maior credibilidade e por isso atrai e engaja cada vez mais pessoas.

Notem, é uma questão fundamental, e explica o porquê produtores FairTrade mudam não apenas suas práticas agrícolas, mas também a forma como veem o mercado, a comunidade e seu protagonismo.

Para falar com maior propriedade busquei ir à fonte, um dos pioneiros da certificação o padre Holandês Francisco Van Der Hoveen escreveu recentemente o livro Manifesto Of The Poor, ao ler o livro fica fácil compreender as origens do movimento e sua busca em tirar da extrema pobreza milhares de produtores ao redor do mundo.

O relato do Padre Francisco - atenção é do Padre e não do Papa - mostra como a comunidade indígena no sul do México, formada por pequenos agricultores que cultivam café, conseguiu transformar suas condições antes precárias. Isso, graças a uma mudança nas relações comerciais, se antes eram dependentes de um sistema que expropria boa parte do valor agregado do produto, que fica nas mãos de atravessadores que não agregam valor algum ao produto e muito menos prestam algum tipo de serviço essencial à cadeia produtiva. Ao acessar diretamente a indústria, ao ter contato mais direto com o consumidor final, o produtor se vê em condições mais justas e capaz de, com seu trabalho, seus esforços e sua organização, crescer e acessar cada vez mais longe a cadeia produtiva, sendo então protagonista.

Um exemplo que sempre me chamou a atenção foi a transformação que o Movimento FairTrade proporcionou a uma comunidade rural no país africano de Costa do Marfin. Lá, a produção de cacau é conhecidamente dominada por sistemas de produção nada sustentáveis, que praticam o tráfico de pessoas, a exploração de mão de obra infantil, o trabalho escravo e a degradação ambiental, além da deterioração de comunidades.

Fundada em 2004, a Cooperativa Ecookim conta com mais de 11.800 membros e se tornou uma das mais importantes instituições de apoio às famílias de agricultores no país. São projetos que vão desde fornecimento de assistência técnica, insumos e máquinas agrícolas, a empréstimos para cooperados, industrialização do produto, construção de escolas e oportunidades de intercâmbio para alunos.

Mas as transformações promovidas por esse movimento são mais impressionantes nos relatos de seu presidente que conta que antes do FairTrade apesar de plantar cacau, ninguém na comunidade sabia qual era o gosto do chocolate. Apesar de ter um cacau de boa qualidade, nenhum produtor sabia o destino final de seu produto. Apesar de ser produtor de um alimento muito importante no mercado internacional, nunca tiveram contato com representantes das grandes indústrias. A realidade mudou a tal ponto que atualmente membros da cooperativa fazem visitas para conhecer a produção de chocolate em outros países, seus filhos participam de intercâmbio em universidades da suíça e desde cedo já conhecem o processo de produção do chocolate, a cooperativa é sócia de uma grande indústria de cacau na suíça. Ainda antes, poucos tinham estudos e acesso à escola, atualmente com a construção da escola em Dibobly a cooperativa oferece cursos de educação básica, mas também de técnicas agrícolas, de gestão de negócios e da filosofia cooperativista.

Certamente essas conquistas são muito mais do que uma certificação, é um grande movimento que realmente transforma vidas. E você concorda com a terminologia movimento? 



*Ulisses Ferreira é especialista em cafeicultura sustentável e consultor de associações e certificações agrícolas

ULISSES FERREIRA DE OLIVEIRA

Administrador, especialista em cafeicultura sustentável, Diretor do Departamento de Desenvolvimento e Meio Ambiente da Prefeitura Municipal de Botelhos e consultor de associações e certificações agrícolas.

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EDUARDO CHAGAS MATAVELLI

POÇOS DE CALDAS - MINAS GERAIS - PROFISSIONAIS DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS

EM 06/08/2016

Concordo com o termo movimento mestre Ulisses. É interessante ver todo o "movimento" que os trabalhos do Fair Trade e outros protocolos fazem.

Movimento este, no sentido de mover, principalmente do cafeicultor, que passa a enxergar a atividade de um outro ângulo, mantendo se no negócio é atingindo todos os 5 pilares da sustentabidade.  A "movimentação" é muito grande. Grande abraço!!
ULISSES FERREIRA DE OLIVEIRA

POÇOS DE CALDAS - MINAS GERAIS - PROFISSIONAIS DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS

EM 05/08/2016

João Aparecido, brilhante seu comentário! Sim a certificação traz uma bagagem de boas práticas fundamentais para a sustentabilidade da cafeicultura. A transformação não pode ser apenas financeira, pois essa não se sustenta, mas no pilar da sustentabilidade a parte econômica com certeza tem um peso grande! Trabalho com cindo pilares para a sustentabilidade, sendo: Econômica, Social, Ambiental, Política e Cultura. Somente ao atingir esses cinco fatores uma localidade, comunidade ou país poderá verdadeiramente se considerar um local desenvolvido. E é isso que queremos não é?
JOÃO APARECIDO

VARGINHA - MINAS GERAIS - COMÉRCIO DE CAFÉ (B2B)

EM 04/08/2016

Entendo que a expressão MOVIMENTO refere-se principalmente a uma determinada  ação coletiva de determinado setor da sociedade ou organização social com objetivo de defesa ou preservação de uma determinada ordem na sociedade. Assim sendo eu vejo que esta terminologia que o colega esta utilizando é verdadeiro , mas  seria de extrema importância que estes movimentos organizados tivessem a certificação fairtrade como alvo principal de suas ações no sentido de melhorias para estes associados e cooperados e não somente a questão financeira . Digo isto porque o futuro de todo nosso parque cafeeiro esta centrado , evidentemente ,nas boas práticas hoje implantadas e principalmente na diminuição do êxodo rural .  

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