Por João Carlos Seixas Reis*
A quantidade de água em grãos de café verde é um dos principais indicadores de qualidade – grãos com umidade muito baixa ficam frágeis, envelhecem mais rápido e dificultam a torra; por outro lado, um café com água demais corre o sério risco de ser contaminado por ocratoxina. A porcentagem de umidade ideal adotada pela indústria fica entre 11% e 11,5%.
Embora o produtor tome todos os cuidados para que seu café chegue ao cliente nas melhores condições, muitos compradores têm reclamado de grãos com baixa umidade. Essa situação tem deixado muitos produtores confusos. Eles desconfiam de problemas no transporte e estão até mesmo investindo em novos aparelhos de medição de umidade.
A fazenda Daterra, de Patrocínio (MG), passou por esse impasse no final de 2017: vários clientes reclamavam que, ao medir a umidade dos grãos, as leituras apresentavam números entre 8% e 9%, enquanto as leituras na fazenda mostravam 11% de umidade. Para deixar tudo mais estranho, os clientes diziam que, apesar disso, o sabor do café e o comportamento na torra estavam ótimos.
Para solucionar o mistério foi necessário comparar todas as marcas de aparelhos de medição de umidade: algumas apresentam resultados idênticos, outras variam completamente. Isso acontece porque existem mais de 35 metodologias para medir a umidade de grãos e, ao estudá-las, a equipe de pesquisa da fazenda encontrou a resposta: cada equipamento utiliza uma metodologia diferente e, consequentemente, apresenta resultados diferentes.
É muito comum que as análises de umidade sejam feitas sob uma metodologia chamada Café ou Cafi, baseada na extração da umidade total do grão. Nesse método, o intervalo ideal gira em torno de 11% a 11,5% de umidade. O problema é que muitos dos novos medidores eletrônicos agora são indexados à norma ISO 6673, que exibe resultados diferentes da escala Cafi. Na metodologia ISO 6673 a determinação da perda de massa em café verde deve ser feita em estufas a 105 °C por dezesseis horas e o intervalo ideal gira em torno de 8,4% a 9,4% de umidade.
A forma mais comumente empregada para a medição de umidade nas fazendas, torrefações e entre profissionais do ramo é a medição por capacitância – esse é o método aplicado nos aparelhos eletrônicos de determinação de umidade. As curvas de calibração desses medidores são obtidas em laboratório, usando-se como referência o método-padrão de estufa, e essas curvas são então transferidas para a memória dos aparelhos.
O Inmetro publicou em outubro de 2017 uma nova portaria que exige que todos os fabricantes de medidores de umidade sigam a norma ISO 6673 – isso também aconteceu em outros países, mas, infelizmente, nem todo mundo ficou sabendo da mudança e ainda há muitos equipamentos com escala Cafi em uso no mercado.
A questão é muito séria e pode fazer com que produtores passem a secar por menos tempo seus cafés e acabem vendendo grãos com água demais: caso já tenham algum aparelho calibrado com a ISO 6673 e tentem secar seus cafés até 11,5% de umidade, isso na verdade seria o equivalente a aproximadamente 13% na tradicional metodologia Cafi. Safras inteiras poderiam ser prejudicadas.
Com o objetivo de ajudar produtores e compradores a entender a diferença de leituras das amostras de café verde, o time de pesquisa da fazenda Daterra desenvolveu uma tabela que correlaciona os valores entre as duas metodologias.
Se você não sabia disso, não precisa jogar fora seu medidor de umidade; não existe aparelho certo nem errado – são apenas escalas diferentes! Mas é essencial que cada profissional conheça a metodologia empregada por seu aparelho para estabelecer um diálogo com menos ruído na cadeia.
*João Carlos Seixas Reis é gerente de ações estratégicas da Daterra. Este conteúdo foi desenvolvido em parceria com a empresa.
Texto originalmente publicado na edição impressa da Revista Espresso. Para saber como assinar, clique aqui.