Por Enrique Alves*
Que o estado de Rondônia é o quinto maior produtor de café do País e está entre os três maiores estados produtores da espécie canéfora (robusta e conilon), você já deve saber. O que passa despercebido é o grande potencial que o estado e a região Amazônica têm para ser um polo produtor de robustas especiais, ou finos. Você pode estar se perguntando: mas robusta e conilon não é tudo a mesma coisa? Na verdade, não! Mesmo que comercialmente não se faça distinção e ambos pertençam à mesma espécie (Coffea canephora), são diferentes! Robusta e conilon têm características de plantas, frutos e propriedades organolépticas – cor, sabor e aroma – que os distinguem.
O Brasil, por influência do Espírito Santo, maior produtor de canéfora do País, convencionou chamar todos os cafés canéfora de conilon, enquanto o resto do mundo usa o termo robusta. Até aí, nada demais, e o mercado consumidor convive bem com as duas nomenclaturas. Mas os cafés canéfora, até pouco tempo relegados à posição de coadjuvantes, utilizados para baratear o produto em blends (misturas) com arábica, ou ainda na indústria de solúveis, está aos poucos mudando de patamar. É nesse momento que a distinção entre robusta e conilon, por mais sutil que possa parecer, se faz interessante.
Nova visão dos cafés conilon e robusta no mercado
O alto rendimento industrial, o maior teor de cafeína, a bebida neutra e encorpada serão sempre características importantes no canéfora. Entretanto, mesmo a indústria já identificou o potencial que a melhoria de qualidade pode trazer. Com isso, não só aumentaria o rendimento dos grãos, como seria possível aumentar a percentagem desses cafés nos blends. Mas a grande mudança está mesmo no que diz respeito à produção de robustas finos. Estes são cafés em que as características sensoriais vão além do corpo e da neutralidade.
Os robustas e híbridos (cruzamentos de robusta e conilon), que estão hoje no campo em Rondônia, têm nuances como acidez agradável, doçura, aromas e sabores que lembram chocolates, nozes e frutas. Tudo isso sob uma nova ótica sensorial, numa paleta específica e característica dos cafés canéfora. Quem diz isso são os especialistas em degustação de cafés, os Q-graders, que se baseiam também no Protocolo de Degustação de Robustas Finos (PDRF), lançado em 2010 pelo Coffee Quality Institute (CQI).
Espaço aberto para os Robustas Amazônicos
É nesse contexto de novos padrões de qualidade e mercados gourmets, ainda pouco explorados pelos cafés canéfora, que Rondônia, principal representante da cafeicultura na região Amazônica, tem tudo para se destacar. O estado tem vocação natural para a produção de robustas finos, considerados os robustas puros ou os híbridos. Os solos são planos, agricultáveis e o clima favorável. Com média pluviométrica que pode ultrapassar de 2.000 mm de precipitação anual e temperaturas altas o ano todo, o desenvolvimento destes cafés se destaca. Tanto que, em visita ao parque cafeeiro no estado, se verifica que os principais clones comerciais plantados são híbridos, com características predominantes dos robustas.
Conhecidos pelo crescimento vigoroso, porte alto e exigência em água e fertilidade do solo, os híbridos têm se dado muito bem com as mudanças pelas quais a cafeicultura de Rondônia tem passado na última década. Esta evolução passa pelo uso de clones superiores, poda programada, irrigação e colheita semimecanizada. O impacto pode ser visto no ganho em produtividade média do estado, que cresceu cerca de 255%, devendo alcançar 33 sacas/ha de café beneficiado na safra 2019, com produção estimada de 2,1 milhões de sacas. E começa a ser reconhecido também pela melhoria de qualidade dos grãos.
Robusta Amazônico, propriedade da Família Bento, em Cacoal (RO) / Foto: Renata Silva
Robustas de Rondônia têm qualidade reconhecia
No quesito qualidade, quando comparado ao conilon, o robusta tende a ter grãos de peneiras maiores e se destacam como cafés de corpo agradável, com tendência a nuances sensoriais que vão além da neutralidade. Ainda na década de 1980, experimentos de caracterização da qualidade realizados por pesquisadores da Embrapa Rondônia, em parceria com o Instituto Agronômico de Campinas (IAC), observaram características sensoriais superiores dos robustas. Mais recentemente, baseado no PDRF, foi realizado um amplo estudo genético na coleção de clones canéfora de elite da Embrapa Rondônia, e novamente se identificou a tendência para produção de cafés finos nos robustas e híbridos.
Estes resultados de pesquisa já são constatados na prática. Um exemplo disso é que Rondônia é um dos poucos locais no mundo com uma cafeteria que se especializou em servir Robustas Amazônicos finos. Outro exemplo pode ser observado na Semana Internacional do Café (SIC), que ocorre anualmente em Belo Horizonte (MG) desde 2016, onde os cafés Robustas Amazônicos de Rondônia obtêm destaque positivo e ganham premiações. Foram comparados, por especialistas, aos famosos ‘Robustas Indianos’ e despertou entusiasmo e surpresa nos visitantes do estande. Suavidade, aroma e corpo dos Robustas Amazônicos são características realçadas pelos degustadores leigos e profissionais no evento. Estes cafés foram vendidos a preços compatíveis aos dos melhores cafés em exposição.
Estes fatos demonstram o potencial, ainda pouco explorado, dos robustas de qualidade. Retratam o apelo ambiental, social e comercial que os cafés produzidos na Amazônia podem ter e que esta região tem tudo para surfar nessa onda de reconhecimento da qualidade sensorial dos canéforas.
Então, avante! Que venham os ‘Robustas de Rondônia’! Sabor e qualidade que vêm da Amazônia.
Robusta Amazônico, propriedade de Marcelo Braun, em Alto Alegre dos Parecis (RO) / Foto: Renata Silva
*Enrique Anastácio Alves é doutor na área de Engenharia Agrícola e, desde 2010, atua como pesquisador A na Embrapa Rondônia nas áreas de Colheita, pós-colheita do café e qualidade de bebida. Contato: enrique.alves@embrapa.br