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Como o La Niña persiste ao longo deste ano, é essencial entender quais são os riscos imediatos que cercam o fenômeno para culturas como o café, que dependem da chuva;
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O fenômeno pode levar a níveis de precipitação e temperaturas abaixo da média na metade inferior da América do Sul, afetando áreas cafeeiras no Brasil. Na América Central, o La Niña provoca chuvas mais fortes durante a temporada ativa de tempestades tropicais (o mesmo resultado também pode ser esperado na Colômbia);
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Enquanto possíveis impactos futuros são estudados, ocorrências passadas ainda estão sendo avaliadas: uma safra de arábica possivelmente menor no Brasil para 2022/2023 está sendo considerada, com efeitos diretos de dois anos de La Niña, que causou seca em 2020 e geadas em 2021.
Com uma nova frente fria ameaçando chegar ao Brasil, os impactos climáticos sobre a produção de café merecem outra discussão. Os padrões climáticos são especialmente importantes para a commodity, já que cerca de 96% das áreas colhidas no mundo dependem da chuva, ao invés de irrigação - em comparação com 77% em média para commodities em geral, segundo a FAO.
Espera-se que o La Niña persista até 2022, com maior probabilidade em junho, julho e agosto, mas ainda com 60% de chance de permanecer ativo até dezembro (Gráfico #1). Durante o primeiro período mencionado, o La Niña provoca temperaturas mais frias na metade inferior da América do Sul (Gráfico #2) - razão pela qual as temperaturas no Brasil caíram abaixo dos níveis médios nas áreas de café recentemente. Em termos de precipitação, o fenômeno leva a chuvas abaixo da média no Brasil - durante o inverno, quando as chuvas já são escassas - e chuvas mais fortes na América Central, em linha com as expectativas de uma temporada de tempestades tropicais ativa. Mais detalhes podem ser encontrados abaixo, no Apêndice.
Por enquanto, as áreas cafeeiras estão livres de ameaça de geadas nos próximos dias, com temperaturas caindo para 5ºC no Sul de Minas Gerais (também exploradas abaixo, no Apêndice). Ainda assim, a frente fria que se aproxima do Sul levanta preocupações e deve ser monitorada.
A cautela com o clima se justifica: com a colheita brasileira em 13% - embora atrasada em relação à média de 17% - o impacto da seca e da geada sobre as áreas de arábica fica mais evidente e os ajustes nos números da safra estão ocorrendo. No Gráfico #3, realizamos um exercício utilizando os dados recentes divulgados pela Conab, de áreas de produção e formação, bem como dados de NDVI*. O estudo sugere que a safra pode ser inferior às atuais 37,9 milhões de sacas estimadas, possivelmente atingindo 33,3 milhões de sacas (Gráfico #3), o menor valor para um ano de bienalidade positiva desde a seca de 2014!
Consequentemente, o balanço de Oferta & Demanda de arábica ficaria negativo em 2022/2023 (Gráfico #4), marcando um déficit consecutivo após 2021/2022, o que sustenta os preços de médio prazo.
Em resumo
Com um La Niña ativo pelo terceiro ano consecutivo, o clima se torna o principal ponto de discussão no mercado de café. Os efeitos do último La Niña ainda estão sendo avaliados, já que a colheita 2022/2023 ocorre no Brasil e o desenvolvimento da safra 2022/2023 está em andamento nos países do grupo de outubro, mais propensos a serem atingidos por tempestades tropicais - especialmente na América Central.
O fenômeno leva a diferentes padrões e, nos próximos 3 meses, são esperados temperaturas mais baixas na metade inferior da América do Sul. No final do segundo semestre, a mesma área pode ter chuvas impactadas negativamente - e a seca de 2020 ainda está tão viva na mente de todos quanto a geada de 2021. Com isso, os preços do café provavelmente terão algum suporte no médio prazo, mesmo que o mercado veja menos volatilidade no curto prazo.
*O Índice de Vegetação por Diferença Normalizada (NDVI) quantifica a vegetação medindo a diferença entre o infravermelho próximo (que a vegetação reflete fortemente) e a luz vermelha (que a vegetação absorve). Fonte: GISGeography.