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Os custos energéticos dos estresses

ESPAÇO ABERTO

EM 19/09/2022

4 MIN DE LEITURA

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Prof. José Donizeti Alves*

Pela fotossíntese das folhas, o cafeeiro produz glicose que serve como substrato para a respiração (Glicólise, Ciclo de Krebs e Cadeia de Transporte de Elétrons Mitocondrial), que tem como uma das funções produzir energia na forma de  ATP (36 ATPs/glicose). O “pool” de  Adenosina Tri Fosfato (ATP) serve como um depósito temporário de energia, que é prontamente utilizável pela célula na realização de suas funções, entre elas: fazer a planta crescer, produzir e sobreviver. Para cada um desses processos, é requerida uma certa quantidade de energia que, em termos bioquímicos, é definida como custo energético de construção ou preservação, que é a quantidade de glicose, carbono ou ATP que a planta utiliza para formar um grama de biomassa ou de grama de biomoléculas, respectivamente.  

Sob condições normais de clima e com um manejo adequado, a maior fração dessa energia é  carreada para atender os processos de crescimento e produção, e uma pequena parte é utilizada no combate aos estresses do dia a dia (Figura abaixo, à esquerda). Por outro lado, sob condições de clima adverso ou de manejo inadequado, a maior parte da energia é desviada para montar estratégias de sobrevivência e não para os processos de crescimento e produção (Figura abaixo, à direita).

É importante destacar que o alto crescimento vegetativo do cafeeiro, em anos de bienalidade negativa, logicamente não traz de imediato nenhum benefício para a produção (tanto é que o café produz menos), pois os custos energéticos de construção de folhas (biomassa fotossinteticamente ativa) são geralmente muito elevados. Entretanto, a médio prazo, essa alta demanda de energia traz grandes benefícios à produção, pois a alocação preferencial de energia para mecanismos de crescimento vegetativo, em anos de bienalidade negativa, aumenta o balanço de energia para próximo ano, predispondo a lavoura a produzir mais em um ano de bienalidade positiva. 

Portanto, ao contrário do que muitos pensam, aceitar a bienalidade não é negar o papel central da produção de grãos pelo cafeeiro, mas sim reconhecer que a produção de biomassa, como um meio de produzir e armazenar energia, é um estratégia que o cafeeiro utiliza para deixar mais descendentes (sementes) no próximo ano. Este raciocínio leva a concluir que alta produtividade, pelo alto custo metabólico na produção de um grande número de sementes, queiramos ou não, é fator de estresse para o cafeeiro, que ele contorna com a alternância de produção entre os anos. Lembrem-se que, sob o ponto de vista evolutivo, a planta é apenas o meio pelo qual a semente utiliza para produzir mais sementes.

Voltando para a figura do lado direito, o cafeeiro, para sobreviver à pressão dos estresses como a seca, por exemplo, lança mão de estratégias que gastam muita energia e que, no curto prazo, não se revertem em alocação de biomassa verde, mas no futuro garantem a produção. Resumidamente, podemos citar, de início, os gastos com a percepção dos estresses pelas plantas na síntese de proteínas receptoras na membrana celular. Reconhecido o estresse no cafeeiro, quando murcham as folhas apenas nas horas mais quentes do dia, aumenta a respiração (consome mais glicose) para produzir mais energia, a ser utilizada, por exemplo, na síntese de ABA (para fechar os estômatos) e de etileno (para inibir o crescimento), ativação de sistemas antioxidantes e produção de outras moléculas sinalizadoras. 

Na sequência, quando o estresse já está instalado e é perceptível pelas folhas murchas ao amanhecer, e já ressecadas, a planta aumenta ainda mais a produção e gasto de energia, acelerando ainda mais o consumo de glicose, a fim de produzir mais energia a ser utilizada na síntese de produtos secundários; modificações morfológicas como proliferação de radicelas; diminuição de estruturas reprodutivas; espessamento de folhas;  modificações celulares como deposição de cera e cutícula; lignificação de tecidos; proteínas de transporte de membranas; rearranjo nos lipídeos  das membranas; síntese de moléculas osmoticamente ativas e aquaporinas; e finalmente elevação na síntese de etileno com a produção de níveis tóxicos de EROS.

Com a intensificação do estresse, a pressão ambiental rompe as barreiras de defesas e inicia-se a morte de radicelas, queda de estruturas reprodutivas, ramificações e ramos ladrões, modificações celulares como cavitação no xilema, disparo na síntese de etileno, aumento na toxidez das EROS e paralisação na síntese de antioxidantes que, em conjunto, dá início à senescência geral da planta. Finalmente, como golpe final, há o esgotamento das reservas e da energia das plantas com o iminente colapso de todas as funções fisiológicas do cafeeiro. Como resultado, a produção é mínima (catação) e o replantio é a única solução para a continuidade da atividade cafeeira.

De maneira bastante resumida, tentei mostrar os custos energéticos dos estresses do cafeeiro e como eles desviam a energia que poderia ser utilizada para o crescimento vegetativo e reprodutivo. Percebe-se que, na descrição feita nos últimos três parágrafos, os custos energéticos aumentam com a intensidade e duração do estresse. Esses custos basicamente ficam concentrados em processos de sobrevivência, resultando em menor volume de safra, que no caso do cafeeiro pode-se estender por até dois anos. Qualquer semelhança com os dois últimos anos agrícolas, onde tivemos uma longa seca, intercalada por geadas, não é mera coincidência. 

*Prof. José Donizeti Alves - FisioCafé Consultoria e Palestras Ltda - fisiocafeconsult@gmail.com - (35) 99200-6703

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