Por Ciro Rosolem*
O acordo de livre comércio entre a União Europeia e o Mercosul é, sem dúvida, um marco em nossas relações internacionais. Entretanto, quais serão os reais benefícios para o agro brasileiro? O acordo ainda precisa ser homologado em todos os países, e já aparecem contestações, principalmente da França e Irlanda. Mas por quê?
Um recente estudo da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) mostra que a produção e o comércio de produtos agropecuários sofrem com políticas protecionistas, que, entretanto, são ineficazes. São eficazes em satisfazer os produtores daqueles locais, mas resultam em produtos mais caros para os consumidores. São investidos US$ 705 bilhões em políticas agropecuárias pelos 53 países avaliados. Em média, 20% da receita dos produtores de 36 países da OCDE vem de subsídios, o que distorce o mercado. No Brasil, menos de 3% da receita vem de subsídios. Dá pra entender porque eles não estão muito felizes?
Outra questão é para onde vai o subsídio. Em dois terços dos países, apenas 30% dos subsídios vão para infraestrutura, enquanto no Brasil mais de 50% vai para infraestrutura, com mais da metade em investimentos em sistemas de inovação. Ou seja, se somos eficientes, vamos ficar mais eficientes. E isso significa, provavelmente, em necessidade de aumento no subsídio em países em que a agricultura não consegue ser tão competitiva.
Imaginando que esta barreira seja vencida, e deverá ser vencida, ainda temos outros pontos a considerar para o pleno acesso aos mercados europeus. A população da Europa, depois de usar e abusar de seu ambiente está extremamente preocupada com a sustentabilidade, aquecimento global, etc. Muitos países já estão adotando barreiras que tem a ver com a rastreabilidade dos produtos, das práticas agrícolas utilizadas e dos aspectos trabalhistas e sociais envolvidos. Muitas tradings que atuam no Brasil exigem, como seria mesmo lógico, que a produção atenda à legislação quando às relações de trabalho e ambientais. O problema é que já existem corporações que estão estabelecendo exigências muito além destas, tal como desmatamento zero. Veja bem, não é desmatamento legal, é desmatamento zero. Ou seja, não pode abrir novas áreas, mesmo que a legislação brasileira permita.
Então, o acordo recentemente celebrado pode abrir uma nova perspectiva de mercado para os produtos agrícolas brasileiros, mas existem obstáculos a serem superados. Alguns, como os subsídios, não dependem de nós. Mas nossos produtos, para conquistarem o rico povo europeu, precisarão ser produzidos sob normas específicas, de modo a atender a demanda deste exigente mercado. Não se trata de concordar ou não com as exigências, pois o freguês sempre tem razão. Se for um freguês rico, mais razão ainda.
*Ciro Rosolem, vice-Presidente de Comunicação Científico Agro Sustentável (CCAS) e Professor Titular da Faculdade de Ciências Agrícolas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (FCA/Unesp Botucatu)