Por José Donizeti Alves e Paulo Mazzafera
Após um longo período de seca e com a volta das chuvas no início da primavera, é grande a expectativa da florada do cafeeiro. Assim que as flores se abrirem vai terminar o longo ciclo do florescimento que se iniciou no outono com a indução, em cujo momento as gemas adquiram competência para o florescimento, passaram pela diferenciação, quando então teve início a formação das estruturas do botão floral e, na sequência, entraram em dormência, mediada pela elevação dos níveis de ácido abscisico (ABA), em resposta a seca. A partir daí, por conta das baixas temperaturas e umidade, condições climáticas típicas do inverno brasileiro, o botão floral se manteve fechado e quiescente, prontos para abrir, esperando apenas um estímulo.
Como sempre, o cafeeiro vai responder ao estímulo ambiental, induzindo respostas fisiológicas que vão culminar com a abertura das flores. Este estímulo vem com a chuva, que sinaliza aos botões florais (que neste momento encontram-se com 65% de umidade) que interrompam a produção e ABA e passem a produzir dois outros hormônios, giberelina e citocinina (sendo o primeiro o mais importante). Sob a influência desses dois promotores da floração, inicia-se uma série de modificações que induzirão, após dois dias da chuva, o crescimento dos botões até que eles se abram em flor. Curiosamente, antes das chuvas não existe conexão xilemática bem definida entre o pedúnculo da flor e os tecidos reprodutivos. Neste caso, o período de 8 a 12 dias, demandado entre a chuva e a abertura completa de todas as flores, é o tempo necessário para que, em resposta ao aumento dos níveis de giberelina, os vasos do xilema se formem, permitindo um rápido aporte de água até as flores que se abrem. Em resumo, a abertura das flores acontece em decorrência das chuvas e das alterações hormonais por ela provocadas.
Nunca é demais destacar que conhecer as fases fenológicas do cafeeiro e sua relação com o clima constitui-se em poderosa ferramenta sobre o manejo global da lavoura. Para tanto, cabe ao cafeicultor e aos técnicos observarem os caracteres morfológicos das plantas e entender seus requerimentos fisiológicos para adequar as recomendações técnicas aos recursos do ambiente. No caso da florada, são três os principais pontos a serem observados: (a) nutrição mineral balanceada sempre com base em análises de solo e folha, com destaque especial ao boro, zinco, cálcio e magnésio; (b) preparo fisiológico do cafeeiro em que é desejável que, logo após a colheita, as plantas estejam bem enfolhadas, sadias e com bons níveis de reservas de carboidratos nos ramos e folhas fotossinteticamente ativas, a fim de suprir em energia e carbono a frutificação; (c) adequadas condições climáticas que incluem luminosidade média, temperaturas amenas e chuvas regulares.
Em vista do calor e seca extremas que estamos passando há mais de um ano e das recentes geadas, é quase certo dizer que as flores de hoje não serão, em sua totalidade, os frutos de café que vamos colher em 2022. Vai haver quebra na produção. Por conta disso, revendo alguns números de dois experimentos clássicos com café, vemos que em condições adequadas, cerca de 37% das flores transformaram-se em chumbinhos. Em outro artigo, somente 34,5% das flores se transformaram em frutos. Infelizmente, por conta das adversidades extremas que abateram no Sul de Minas, Cerrado Mineiro, parte das Matas de Minas Gerais e na Mogiana Paulista e por conta da desfolha dos cafeeiros, esses números podem ser ainda menores.
Finalmente, se desejamos uma grande produção em 2022, devemos preservar ao máximo o número atual de folhas na planta a fim de não deixar cair a relação fonte-dreno de forma que uma maior fonte (maior número de folhas) suprirá a planta de carbono e energia para que ela suporte um maior dreno (número de frutos). E se quisermos uma grande produção em 2022 e 2023, devemos além de preservar as folhas atuais, fazer o cafeeiro lançar nós, de modo a aumentar o número de rosetas disponíveis para a frutificação e assim, poder compensar uma possível queda no vingamento das flores e no pegamento dos frutos por conta do calor e seca.
Como sempre frisamos, o café é uma cultura resiliente a seca, mas não suporta seca severa. Sempre que ocorre uma estiagem muito longa, essa resiliência se expressa depois de um a dois anos. Isso implica em dizer que, depois de uma forte seca como a que estamos vivenciando, o cafeeiro sente de imediato os efeitos, entra em estresse hídrico, reduz o crescimento e produz menos café que o esperado. No ano seguinte, desde que as condições de clima se normalizem e o cafeicultor volte ao manejo convencional, ele se recupera e passa a produzir normalmente. Portanto, nunca é demais dar uma força e fazer a fisiologia do cafeeiro trabalhar a nosso favor. Uma das estratégias que recomendamos para melhorar a tolerância do café a seca e ao calor, além da utilização de variedades mais tolerantes e adaptadas à sua região, o técnico deve manejar o mato nas entrelinhas e ficar atento à nutrição da lavoura com magnésio, a fim de evitar o estresse oxidativo, a escaldadura e ajudar na preservação das clorofilas.
Uma dica final que traz resultados bastantes satisfatórios para mitigar os efeitos da falta de água, é a de cuidar da parte física, microbiológica e da fertilidade do solo, principalmente aquela em maiores profundidades de forma a permitir um ambiente mais favorável ao desenvolvimento de raízes e melhorar a absorção da água subsuperficial.