As mudanças no mundo atual acontecem muito rapidamente, daí a necessidade de estarmos preparados para aceitá-las, e isso nos leva, então, a uma reflexão: será que estamos preparados para isso? O conceito de sustentabilidade na produção de alimentos se multiplica no mundo todo fazendo com que, cada vez mais, as pessoas se preocupem em realizar um consumo consciente. Essa mudança no estilo de vida das pessoas é visível na crescente demanda por produtos e bens produzidos de forma sustentável.
Nos dias de hoje temas como agronegócio globalizado, sustentabilidade, certificação, rastreabilidade, qualidade, origem, mudanças climáticas, boas práticas agrícolas, aquecimento global, novas relações trabalhistas, entre tantos outros, passam a fazer parte do dia a dia do homem do campo brasileiro, independentemente do tamanho de sua exploração. Isso leva então, principalmente aos pequenos, o cumprimento de exigências ainda maiores e, portanto, a necessidade deles virem a entender que uma produção agrícola só será sustentável se permitir condições de trabalho decente em toda a sua cadeia produtiva. Não devendo, também, afetar de forma negativa o meio ambiente e sendo adequadamente controlada e monitorada, visando a produção de alimentos de melhor qualidade e com preços que ao mesmo tempo atendam as necessidades do mercado e também remunerem o produtor de forma justa.
Diante desse cenário a pergunta a ser respondida deverá ser: "Será que a agricultura que estamos praticando tem essas condições? Isso pode ser facilmente respondido, basta um olhar para entendermos que os atuais conflitos sociais não estão acontecendo mais somente nas grandes cidades, eles agora estão acontecendo por todos os lados. Baixa escolaridade, desemprego e violência não são mais questões só das cidades, agora são também graves distúrbios no campo. Vejam, por exemplo, os conflitos por terra, por trabalho (migração dos trabalhadores e condições insalubres de trabalho no campo), o aumento do consumo de drogas e a situação de abandono de grande parte das pequenas propriedades país afora. Assim, podemos perceber que o atual modelo agrícola não é sustentável, portanto, a questão agora não é só como torná-lo sustentável e sim primeiro, como resolver a questão das desigualdades e pobreza no campo sabendo que as forças do mercado são conservadoras e centralizadoras do capital.
Não é surpresa pra ninguém (e muito menos para as organizações internacionais) o fato de que este modelo de desenvolvimento rural que aí está não é mais capaz de cumprir com seu papel (Revolução Verde, 1960). Seja o de eliminar a fome e criar condições de permanecia do homem do campo no campo, quando na verdade, acabou desviou recursos da agricultura para o fortalecimento de estruturas urbanas, destruiu serviços de pesquisa e extensão rural e ajudou a transferir a população rural para as periferias das grandes cidades. Com relação a agregação de valor, também não foi capaz, pois o país continua exportando nossos produtos agrícolas na grande maioria como commodities, com relação ao meio ambiente continua degradando e desmatando, e na utilização de recursos não renováveis também segue usando de forma exploratória. Já o uso de pesticidas, no lugar da racionalização cada vez se aumenta sua utilização e pior, em muitas das vezes de forma irresponsável. Em fim, o atual modelo de produção agrícola brasileiro está ultrapassado e não deve se sustentar por muito tempo.
Diante disso e de tudo que estamos vendo acontecer no país, não resta outra alternativa aos produtores rurais que não seja a de eles mesmos assumirem a dianteira do negócio e protagonizarem seu próprio desenvolvimento. Mas, para isso, primeiro vão precisar entender que desta vez será necessário levar em consideração o fortalecimento da agricultura familiar e não dos grandes grupos empresariais (empregado pelos militares em 1964), ou seja, o desenvolvimento de um modelo mais justo e homogêneo. Modelo este que não deverá vir a ser promovido por meio de pacotes tecnológicos concebidos por intelectuais, por técnicos de gabinetes e tão pouco, por políticos. Ele deve ser um processo amparado nas reais necessidades dos produtores, nas experiências e no saber fazer das famílias de agricultores. Este novo modelo deverá ser baseado em um novo conceito de associação dos produtores, de transferência de conhecimento e de apoio governamental e, estar sustentado na produção de produtos de qualidade ambientalmente corretos.
Não resta outro caminho, assim, resgatar os valores éticos e morais, as instituições de pesquisa e extensão rural e fortalecer nossa representação com certeza deverão ser os primeiros passos a serem dados. Caso contrário, vamos continuar sofrendo ataques visando nosso enfraquecimento de modo a sermos mais facilmente dominados. O mundo todo sabe de nossas forças, nós também temos consciência disso, o problema é que ainda não estamos preparados para as mudanças que aí estão.
*Francisco Sérgio Lange é produtor de café especial, presidente do Sindicato Rural de Divinolândia (SP) e um dos principais entusiastas da Associação dos Cafeicultores de Montanha de Divinolândia (SP)