Entre os dias 31 de outubro e 12 de novembro, a comunidade internacional se reunirá em Glasgow (Reino Unido) para discutir o futuro do planeta. Na Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática (COP 26), os representantes dos países do globo definirão o nível de ambição com o qual enfrentarão aquele que é o principal desafio da humanidade no século XXI. Decisões políticas moldarão o mundo em que viveremos nas próximas décadas, determinando a magnitude de uma série de problemas diretamente relacionados com a mudança climática – conflitos armados por recursos naturais, pandemias, redução da oferta de alimentos, entre outros.
Enquanto predomina a incerteza, a mudança climática não dá trégua. Os efeitos adversos do fenômeno já são uma realidade para milhões de agricultores ao redor do planeta. Por isso mesmo, é interessante notar como soluções locais para atenuar os impactos negativos da mudança climática têm sido, aos poucos, desenvolvidas. Diante de um problema concreto, agricultores de distintos países têm adotado estratégias pragmáticas para superar dificuldades causadas pela falta de iniciativa política nas esferas mais elevadas de poder.
Entretanto, o imobilismo não é o único a prejudicar a busca por soluções. O voluntarismo desprovido de conhecimento concreto pode ser tão nocivo quanto a inação. Não devemos confundir o risco da mudança climática – ou seja, a transformação radical das condições que sustentam a vida humana nos diferentes ecossistemas da Terra – com um impulso para ações que não levem em conta a diversidade desses ecossistemas. Afinal, as soluções mais indicadas para uma determinada região muitas vezes são inadequadas para outras áreas com características distintas.
Tal conclusão nos leva – ou deveria nos levar – a um importante desdobramento: o futuro da humanidade depende de uma melhor compreensão sobre os fatores que facilitam a adaptação dos seres humanos a um dado ecossistema, e não o contrário. Se há algo comprovado é o fato de que somos capazes de sobreviver sob distintas condições. Do Alasca ao Saara, da Amazônia à Sibéria, encontramos soluções inovadoras para garantir o povoamento estável. Sempre que buscamos transformar radicalmente as condições desses ecossistemas, falhamos no longo prazo. Seria um erro continuar ignorando esse princípio básico da relação entre os humanos e o planeta, lançando mão de um “otimismo tecnológico” absolutamente irrealista.
Reconhecer nossa subordinação às condições do planeta que habitamos significa valorizar o papel do conhecimento específico. Não raramente, o debate sobre a adoção e difusão de inovações na agricultura sugere implicitamente que (1) as melhores soluções são aquelas trazidas de longe e (2) apenas as chamadas “tecnologias avançadas” importam. No entanto, tais pressupostos ignoram a enorme capacidade de inovação daqueles que vivem a rotina da atividade agrícola. Para as próximas décadas, deveremos refletir sobre as bases e a realidade da pesquisa científica aplicada, integrando de forma crescente o conhecimento concentrado nas universidades e o conhecimento acumulado entre os usuários dos recursos naturais. Caso contrário, continuaremos propondo soluções abstratas.
Diga-se de passagem, a abstração não se limita à proposição de soluções. É comum esquecermos de perguntar às comunidades diretamente afetadas por um problema ambiental quais são as suas preferências e anseios. Esse viés determina, por exemplo, a transposição artificial de uma forma “urbana” de enxergar os desafios ambientais para os contextos rurais. Desafios complexos como a mudança climática são, acima de tudo, um convite à humildade. Quem acha que tem a solução completa, está equivocado desde o princípio.
Em resumo, a Conferência de Glasgow é apenas o início de uma nova tentativa. Mesmo um desfecho ambicioso será concretizado apenas se a comunidade internacional empoderar aqueles que melhor conhecem as condições locais – e, portanto, as consequências práticas da mudança climática. Qualquer solução dependerá do engajamento de todos, algo que implica o reconhecimento dos interesses e da importância do conhecimento alheios.