O recente apelo feito pelo Conselho Nacional do Café (CNC) para que o governo do Brasil honre os seus compromissos perante a Organização Internacional do Café (OIC) revela uma preocupante tendência. Nela, o cuidado com o orçamento se confunde com o descuido com resultados acumulados após décadas de árduo trabalho. Assim como em outras esferas da vida pública, qualquer conquista no cenário internacional exige um longo período de ação consistente.
Mais especificamente, a Lei Orçamentária de 2018 prevê recursos que equivalem a 49% do total devido pelo Brasil à OIC. Na prática, o governo brasileiro abrirá mão de participar de maneira plena da próxima reunião da Organização caso seja incapaz de pagar sua anuidade até o fim de março. O valor em questão: R$ 1,6 milhão. Trata-se de muito pouco diante do potencial efeito negativo sobre a reputação do país junto aos outros membros da OIC.
É bem verdade, a responsabilidade fiscal é fundamental para a retomada do crescimento econômico. No entanto, medidas como a alocação insuficiente de recursos para a participação plena do Brasil na OIC passam uma mensagem equivocada à comunidade internacional. Afinal, a superação da crise depende de mais diálogo com o mundo – e não de uma retração acrítica, justificada unicamente pela necessidade de corte de gastos. Em política, inexiste vácuo; por isso, cabe a nós ocupar todos os espaços estratégicos possíveis.
A OIC constitui um importante fórum de coordenação entre os Estados vinculados à produção e ao comércio internacional de café. De fato, a mera existência de uma plataforma onde partes interessadas dialogam periodicamente já deveria ser celebrada. Considerando a predominância absoluta dos países em desenvolvimento na produção do produto, a organização joga um papel fundamental na compilação e divulgação de informações que beneficiam cafeicultores, empresas, governos e pesquisadores.
Sob uma perspectiva brasileira, a participação ativa na OIC deveria ser uma consequência natural do protagonismo do país no mercado internacional do café. A liderança vem necessariamente com um preço. Mais especificamente, influenciar os rumos de um setor exige o dispêndio de recursos. Nesse sentido, a incapacidade de honrar os compromissos perante a OIC equivaleria ao Brasil abrir mão de sentar à mesa – reduzindo sua habilidade, portanto, de liderar qualquer ação coletiva.
O equilíbrio do orçamento somente nos levará a uma trajetória de desenvolvimento de longo prazo se acompanhado de um projeto estratégico de país. A ação política em uma democracia implica decisões complexas de alocação de recursos. Para tanto, é preciso tanto dar atenção às preferências dos eleitores quanto delinear um plano coerente, capaz de conectar meios e fins. Por trás dos dados agregados existem decisões que determinarão o perfil da sociedade e da economia do Brasil ao longo das próximas décadas.
Infelizmente, a impressão é a de que inexiste clareza sobre os fins perseguidos por nossos líderes políticos. Muito se fala sobre a tal retomada do crescimento, mas pouco sobre o tipo de crescimento buscado. Vez ou outra um indicador de curto prazo é enaltecido, enquanto limitações estruturais fundamentais seguem afetando a vida de milhões de cidadãos. É justamente essa dificuldade em estabelecer estratégias coerentes que gera decisões como a alocação insuficiente de recursos para a participação plena do Brasil na OIC. Quando somos incapazes de explicar onde queremos chegar, tampouco podemos justificar quais caminhos seguir.