O professor estadunidense Pat Brown não usa meias palavras. À frente da empresa Impossible Foods, o seu objetivo é o de acabar com a pecuária e a pesca – e, consequentemente, com todas as empresas dedicadas à atividade – até 2035. O raciocínio de Brown é simples: de acordo com o empreendedor, só conseguiremos superar o enorme desafio imposto pelas mudanças climáticas se abandonarmos o consumo de proteínas animais. Daí a sua obsessão com o desenvolvimento das chamadas “proteínas alternativas”, algo que, segundo Brown, representa a “última oportunidade” da humanidade para evitar uma catástrofe ambiental.
Brown não é o único a propor soluções disruptivas para os desafios do século XXI. É crescente o número de pessoas dispostas a revolucionar a forma como produzimos e consumimos alimentos. Em geral, o impulso que move tais empreendedores é a preocupação com a escassez de recursos naturais. Em um planeta marcado não apenas pelo contínuo crescimento da população, como também pelas expectativas de aumento do consumo de calorias por parte de bilhões de pessoas, faz sentido nos perguntarmos: a conta fecha?
Brown nos diz que a conta não fecha. E tudo bem. Em um mundo em que as opiniões parecem suplantar os fatos objetivos, pode-se concordar ou discordar de posições como as de Brown. No entanto, ignorar as consequências dessas posições seria um enorme erro. Independentemente da resposta, a mera percepção de que algo está errado oferece incentivos suficientes para a busca por soluções inovadoras. Não por acaso, as principais empresas do setor de proteínas animais têm investido em projetos ligados ao emergente segmento das proteínas alternativas.
O que vale para a carne vale também para o café. Nos últimos meses, diversos veículos de imprensa noticiaram iniciativas para o desenvolvimento de um “café de laboratório”. A justificativa é semelhante: em um mundo com recursos escassos e mudanças climáticas, faz-se necessário pensar em alternativas mais sustentáveis. Uma vez mais, pode-se discordar do diagnóstico, mas não ignorar as suas consequências. O que ocorrerá com o mercado internacional de café se tais alternativas forem desenvolvidas? E se milhões de consumidores forem convencidos de que o “café de laboratório” é uma opção superior?
Aos céticos, um alerta. Pode levar anos, talvez décadas, mas tais alternativas serão desenvolvidas. Voltemos ao exemplo da carne por um instante. Em 2013, diversos jornais noticiaram a produção de um hambúrguer com “carne cultivada” em laboratório. O custo do hambúrguer: 250.000 euros. O projeto, desenvolvido pelo professor Mark Post, da Universidade de Maastricht (Holanda) e financiado pelo fundador da Google, Sergey Brin, marcaria o primeiro passo de uma história de avanços contínuos na produção de “carne cultivada”. Embora não tenhamos dados precisos, analistas estimam que, menos de uma década após o experimento de Post, o custo de produção de um quilo de “carne cultivada” seja de cerca de 100 dólares.
Diante de tamanho avanço, precisamos de uma estratégia clara para competir contra empresas oferecendo tais produtos. Podemos produzir de maneira sustentável e, ao mesmo tempo, reforçar a identidade dos produtos “made in Brazil”. Podemos sublinhar o aspecto humano por trás de nossa produção, reforçando a importância da agricultura para milhões de famílias do Brasil. Se não podemos evitar movimentos disruptivos no mercado, temos a obrigação de antecipá-los, dando uma resposta a eles.
Nunca é demais repetir, a nossa opinião sobre a forma como outros enxergam a agricultura importa pouco. O que importa é que essa visão tem incentivado uma corrida pelo desenvolvimento de alternativas à produção agrícola tradicional. Essas alternativas fatalmente chegarão ao mercado. Estamos preparados para lidar com tais movimentos disruptivos? Essa é a pergunta que deixo a você, prezado(a) leitor(a), nesse fim de 2021.
Um excelente 2022!