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Beco sem saída?

BRUNO VARELLA MIRANDA

EM 30/06/2016

3 MIN DE LEITURA

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Impossível falar de outro assunto. O resultado do referendo sobre a permanência do Reino Unido na União Europeia (UE) dará muito o que falar. Há quase uma semana, analistas de todo o mundo tentam encontrar uma resposta para o Brexit. Em grande medida, a surpresa se deve à falta de ideias para contrabalançar o descontentamento de milhões de britânicos. Se hoje a incerteza econômica paira sobre o mundo, a culpa não pertence apenas a xenófobos ou populistas; também são responsáveis pelo desfecho os defensores do projeto europeu. Afinal, confiaram cegamente no apego da população a uma iniciativa repleta de problemas de representatividade.


Comecemos pela decisão de levar adiante a votação. A questionável ideia de prometer a realização de um referendo se deveu a problemas enfrentados por David Cameron em seu próprio partido político. Farejando a possibilidade de sair fortalecido do processo, o líder britânico converteu uma complexa trama em uma pergunta binária. Resultado: canalizou reclamações difusas em uma única resposta. Pior, escolheu uma questão que levaria a uma ruptura com décadas de construção institucional.

Evidentemente, reconhecer o erro tático de Cameron não esgota as explicações para o Brexit. Desde o anúncio oficial, inúmeras pessoas têm salientado os aspectos trágicos do resultado. É bem verdade, o referendo afeta o futuro de um dos projetos mais ambiciosos da história da humanidade. Ao propor uma solução duradoura para a constante ameaça de conflitos no continente, o projeto de integração europeu possibilitou décadas de crescimento econômico. Permitiu ainda o direcionamento de recursos para o fortalecimento do Estado de bem-estar social, auxiliando um número crescente de países a consolidarem a democracia.

No entanto, o Brexit não é apenas uma causa potencial de problemas. Antes de tudo, é a consequência do acúmulo de distorções nos últimos anos. Se o futuro da UE está em xeque, é porque uma parcela considerável de seus cidadãos se sente abandonada pelo projeto de integração. Ninguém nega que a aproximação entre países tem criado inúmeras oportunidades econômicas, gerando riqueza. Infelizmente, a distribuição desses ganhos tem se dado de forma desigual, gerando a ira daqueles que estão ficando para trás.

Ao mesmo tempo, existe a impressão de que, em se tratando de política, "dá tudo na mesma". Desde meados da década de 1990, é crescente a sensação de que os partidos tradicionais defendem agendas muito parecidas. O enfraquecimento dos partidos de centro-esquerda na Europa, acompanhando a decadência de antigas áreas industriais do continente, demonstra o tamanho do desafio adiante. Em consequência, milhões de cidadãos enxergam os escritórios da UE como um distante império habitado por burocratas indiferentes às distintas realidades vividas no interior do bloco.

Embora a representação acima seja exagerada, o descontentamento não é de todo infundado. A distância entre os pontos de vista de burocratas europeus e a realidade de comunidades empobrecidas no continente chama a atenção. Nos últimos anos, negociações como as relativas ao acordo comercial entre UE e Estados Unidos se caracterizaram pela falta de transparência e a exagerada permeabilidade aos interesses das empresas multinacionais. Por momentos, a impressão é a de que a capacidade de influenciar os rumos do projeto de integração está longe das mãos dos principais afetados pelas decisões políticas tomadas em Bruxelas. Não por acaso, é crescente a queixa contra os chamados "especialistas", cujas opiniões ditas "neutras" acabam por beneficiar apenas uma parte da história.

Onde a democracia falha, a demagogia prospera. De forma preocupante, o desamparo tem sido utilizado como um trampolim por políticos com uma retórica explosiva. A insegurança oferece a oportunidade perfeita para a exploração irresponsável do medo como plataforma política. Talvez este seja o maior desafio da Europa na atualidade: formular um discurso capaz de evitar o avanço do ceticismo em relação ao projeto de integração. Para tanto, deverá reconhecer que a fortaleza da UE reside, acima de tudo, nos valores encarnados por seus membros durante boa parte do século XX.

Caso seja incapaz de aproximar os indivíduos da rotina de seus escritórios e não consagre os direitos outrora garantidos pelo Estado de bem-estar, os retalhos da UE fatalmente cairão em mãos erradas. A Europa já deu inúmeras demonstrações ao longo da história tanto de sua capacidade de construção quanto de destruição. Convenhamos, mais instabilidade é tudo o que não precisamos em tempos de tamanha incerteza. 

BRUNO VARELLA MIRANDA

Professor Assistente do Insper e Doutor em Economia Aplicada pela Universidade de Missouri

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