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A lei do mais forte?

BRUNO VARELLA MIRANDA

EM 20/12/2019

3 MIN DE LEITURA

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As consequências da paralisação do Órgão de Apelação da Organização Mundial do Comércio (OMC) para o futuro do comércio agrícola não podem ser subestimadas. Em 11 de dezembro, este deixou de contar com o quórum mínimo para funcionar. Com isso, o sistema internacional perde um dos seus elementos mais originais e efetivos. Os desdobramentos negativos do desfecho deverão ser sentidos principalmente pelos países em desenvolvimento, usuários frequentes do Órgão. De fato, a posição do Brasil no tabuleiro do comércio internacional será afetada com a possível manutenção desse novo status quo.

O desfecho para a crise no Órgão de Apelação, derivado da obstrução do governo dos Estados Unidos, não chega a surpreender. Já há algum tempo a administração de Donald Trump se recusa a apoiar a nomeação de novos juízes para o Órgão. A justificativa é a percepção de que o sistema multilateral do comércio seria exageradamente condescendente com as políticas do governo da China, prejudicando as exportações estadunidenses. Por outro lado, é evidente a intenção da Casa Branca em transformar os debates na arena comercial em uma série de negociações bilaterais – desejo motivado tanto pela desconfiança alimentada por círculos conservadores em relação a qualquer projeto de governança global quanto pelo folclore ao redor das supostas habilidades de Trump.

O Órgão de Apelação representa um dos elementos fundamentais do sistema de solução de controvérsias da OMC. O processo de discussão de uma disputa comercial no sistema multilateral pode ser resumido da seguinte forma. Passado um período de consultas, em que as partes envolvidas buscam resolver a questão por meio dos canais diplomáticos, um painel é estabelecido com o objetivo de avaliar o caso. O resultado desse painel é um relatório com recomendações, que pode ser acatado pelas partes ou levado ao Órgão de Apelação. Uma vez avaliada pelo Órgão de Apelação, a decisão pode ser implementada.

Dessa maneira, os pareceres do sistema de solução de controvérsias da OMC possuem um nível de enforcement incomum para disputas no âmbito internacional. Costuma-se dizer que o Órgão de Apelação dotou a OMC de “dentes” – ou seja, faz com que a discussão das controvérsias comerciais resulte na implementação de reformas concretas nas práticas dos países membros. Embora o julgamento de controvérsias passadas não imponha um rumo automático aos casos do presente, muitos analistas nutriam a esperança de que as atividades do Órgão de Apelação criassem uma jurisprudência capaz de trazer previsibilidade às regras comerciais internacionais.   

Ao permitir a avaliação de disputas comerciais com base em princípios jurídicos, o sistema de solução de controvérsias da OMC forneceu uma oportunidade única aos países em desenvolvimento. Não é uma coincidência que o Brasil tenha participado tão ativamente desse sistema: sempre que a negociação política foi incapaz de corrigir práticas contrárias aos interesses do país adotadas por outros Estados, o Órgão de Apelação ofereceu uma alternativa que mitigava eventuais assimetrias de poder. No interior do órgão de solução de controvérsias, a diplomacia do Brasil obteve uma série de vitórias que, na prática, facilitou a abertura de oportunidades às exportações do país. A simples existência do Órgão fornecia uma ameaça crível que potencializava as demandas brasileiras.  

Paralisado o Órgão de Apelação, qual o cenário para o futuro? No geral, estamos caminhando rumo a um sistema internacional em que o peso das regras e das rotinas estabelecidas dará lugar aos “toma-lá-dá-cá” sobre temas pontuais. O acordo entre China e Estados Unidos, que prevê a compra de US$ 40 bilhões de produtos agrícolas estadunidenses por parte dos chineses até 2021, é parte dessa nova lógica. Resta saber o que sobrará para os países emergentes enquanto os protagonistas do sistema internacional costuram suas tratativas. Não é preciso muita imaginação para supor que, em um cenário em que a assimetria de poder possa ser utilizada livremente para definir os rumos de uma negociação, países como o Brasil entregarão mais do que recebem – isso quando não ficarem de fora da conversa.

De fato, a paralisação do Órgão de Apelação nos obriga a refletir sobre a natureza do funcionamento de instituições como o sistema de solução de controvérsias da OMC. Pois bem: se bem desenhadas, as regras podem proteger as partes mais fracas em uma negociação. Quando o poder relativo se torna o elemento fundamental em uma negociação, aumentam também os custos de um eventual acordo por parte das partes com menor poder de barganha. Nesse sentido, a obstrução do governo estadunidense pode marcar a inauguração de uma espécie de nova era da “lei do mais forte” no comércio internacional.

BRUNO VARELLA MIRANDA

Professor Assistente do Insper e Doutor em Economia Aplicada pela Universidade de Missouri

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