Estamos à deriva. A fim de compreendermos a dramaticidade do momento, convém resgatarmos a história.
Desde o fim da Segunda Guerra Mundial, milhares de páginas foram escritas com o objetivo de iluminar os caminhos para a industrialização do Brasil. Nelas, o papel da agricultura é geralmente concebido como o de fornecedor de matérias-primas e alimentos baratos para a população. Para tanto, seria necessário dar ao setor as ferramentas necessárias para um salto de produtividade – algo que, diga-se de passagem, também significaria a migração de milhões de pessoas para os principais centros industriais do país.
Percorrido o caminho da industrialização brasileira, estamos distantes de uma solução para o nosso modelo de desenvolvimento. Conclusão semelhante vale para o processo de modernização de nossa agricultura. Com todos os seus méritos, os avanços das últimas décadas vieram com contradições e efeitos colaterais que parecem diminuir a percepção de bem-estar da população brasileira. Ao menos, o descontentamento é visível.
Nem mesmo podemos dizer que a industrialização no Brasil veio para ficar. Já na virada do século XXI, era crescente a preocupação de que estivéssemos diante do encolhimento progressivo do setor.
Houve também quem nos acalmasse, argumentando que transformações estruturais na economia brasileira não significariam necessariamente um empobrecimento do país. Uma vez mais, a agricultura ocuparia o centro do palco, dessa vez como um gerador de empregos e riquezas que viabilizariam a estabilidade do modelo econômico brasileiro. Industrializado ou desindustrializado, o Brasil contaria com uma oferta de alimentos baratos para a sua população. Melhor ainda, seríamos um “celeiro” capaz de contribuir de maneira decisiva para a segurança alimentar no nível global.
No entanto, seguimos somando novas preocupações: é provável que, na próxima década, tenhamos que conviver com preços mais altos dos alimentos. Não podemos nem mesmo argumentar que esses preços mais altos beneficiarão o setor agrícola. Por um lado, parte dessas transformações se deve a um aumento dos custos de produção. Por outro lado, as mudanças climáticas estão criando uma espécie de “loteria” em que os ganhos de agricultores de uma região significam a quebra da produção em áreas concorrentes.
Por tudo isso, deveria ser enorme a preocupação com o futuro do modelo econômico brasileiro. Tal ansiedade, porém, parece ocupar a periferia do sistema político. Há tempos não se fala sobre política industrial. Tampouco se discute uma estratégia de longo prazo para o setor agrícola. Predomina um “curtoprazismo” crônico, enraizado em uma lógica do “cada um por si”. De tempos em tempos, uma teoria da conspiração ou um “moinho de vento” surgem para distrair a plateia.
Estamos à deriva.