Quando perguntados sobre os problemas do país, muitos brasileiros apontam a violência como principal preocupação. Não é difícil obter imagens relacionadas à criminalidade em nossa sociedade: traficantes com fuzis importados nos morros do Rio de Janeiro, o comércio paulistano fechado devido ao temor de represálias por parte de organizações criminosas, assaltos e sequestros nas maiores cidades do Brasil. De fato, a caracterização típica remete aos exemplos de violência urbana repetidos à exaustão pela imprensa. Mesmo os que não foram personagens ou testemunhas de um crime dessas características têm tais representações presentes em seu imaginário.
Razões para tal desfecho abundam. A mais óbvia, o Brasil é um país caracterizado por índices de violência preocupantes. Dados apresentados recentemente pela Organização Mundial da Saúde (OMS) mostram que, de cada 100 assassinatos no planeta, 13 ocorrem em território brasileiro. Somos, ademais, um país em que a maioria da população vive em centros urbanos. Segundo o Censo Demográfico de 2010, quase 85% dos cidadãos brasileiros mora em cidades. É possível que a cifra esteja um pouco exagerada, dado que a própria definição de "centro urbano" não está livre de controvérsias. Critérios metodológicos à parte, entretanto, é inegável a preponderância da população urbana no país. Em muitas dessas aglomerações, predomina a precariedade: limitada presença do Estado, comunidades desestruturadas, avanço de estruturas paralelas dedicadas ao crime. Não deveria assustar, portanto, o fato de a violência ser algo tão presente nos pensamentos dos brasileiros.
Por trás das caracterizações típicas, no entanto, existe um fenômeno complexo e dinâmico. Progressivamente, a sensação de insegurança e os casos de violência vão chegando a porções do território brasileiro que, até então, eram consideradas "seguras". Os exemplos são variados: desde a organização criminosa que utiliza uma pequena cidade como entreposto para seus negócios, passando pelo aumento da atividade criminosa em uma dada região rural. Pode-se dizer que a violência no Brasil possui não apenas sua face mais visível, e urbana, como uma crescente participação na rotina das pessoas que habitam o interior do Estado. Diante de organizações criminosas dotadas de uma considerável capacidade de mobilização e ação, o reduzido aparato de segurança existente na maioria dos municípios brasileiros é praticamente inócuo.
Questão fundamental diz respeito às consequências econômicas da violência sobre a agricultura brasileira. Antes de tratar a questão, vale a pena partir de um caso extremo. Exemplo útil é encontrado na escolha das culturas cultivadas em regiões assoladas pelo flagelo da guerra. Em muitos países africanos, os contínuos conflitos deixaram marcas na sociedade local. Frequentemente, predomina o temor e a escolha de estratégias de sobrevivência de curto prazo. O motivo é simples: para reproduzir sua ação ao longo do tempo, os agentes responsáveis pela violência precisam de dinheiro. Dessa maneira, mesmo áreas relativamente afastadas dos enfrentamentos sofrem com o confisco da colheita por parte de exércitos e milícias, que usam tais recursos para a compra de armas e a alimentação das tropas.
Respondendo aos constantes saques, muitos agricultores africanos abandonaram a zona rural. Por sua vez, pesquisas têm buscado identificar culturas de menor interesse para os grupos envolvidos no conflito e que, ao mesmo tempo, possam garantir o pão de cada dia aos produtores. O desafio é encontrar atividades que não levem ao estabelecimento de um estoque, dado que estes fatalmente serão roubados. Em outras palavras, a intenção é a de encontrar um alívio no curto prazo, ainda que isso signifique que os recursos detidos pelos agricultores sejam usados de forma bastante inferior ao seu potencial, e sem um planejamento mais detido que leve em conta o futuro.
Embora ofereça casos extremos, a África nos ajuda a entender o que ocorre quando produtores rurais têm que lidar com a violência. O aumento dos índices de criminalidade no interior do Brasil pode influenciar, por exemplo, decisões de investimento. O pecuarista que lida roubos de gado provavelmente buscará diversificar suas fontes de renda, ou deixará de investir em atividades produtivas para gastar mais na proteção daquilo que tem. Na cafeicultura, armazenar a colheita na propriedade pode ser uma decisão perigosa e, por isso, dinheiro tem que ser direcionado a prioridades que nada têm a ver com o número de sacas colhidas por hectare. Roubos de tratores ou outros implementos agrícolas igualmente podem afetar a predisposição dos agricultores a usarem seu tempo e recursos financeiros para adquirir bens responsáveis pelo aumento da produtividade.
Os exemplos poderiam seguir, mas não é essa a intenção. O que os parágrafos acima tentam ilustrar é simples. Ao observarem o aumento da violência, os agentes econômicos tendem a responder de diversas maneiras. Adaptação é a primeira reação, e costuma ocorrer quando o risco é moderado. Nesse caso, espera-se um aumento do gasto com a proteção do patrimônio, o que pode ser considerado um desperdício por não contribuir diretamente para o aumento da produtividade da propriedade. Outros podem optar por mudar suas áreas de atuação, escolhendo atividades em que a probabilidade de roubo é menor, ainda que os ganhos se reduzam. Finalmente, casos extremos são respondidos com o abandono das terras e emigração, conforme observado em países da África e da América Central.
Sob a ótica da economia, portanto, o agricultor pode ser visto como o gestor de um dado conjunto de recursos. A forma como o fará depende de diversos fatores: a informação que detém para tomar decisões, o conhecimento acumulado sobre o potencial de geração de lucros daquilo que possui, os incentivos que derivam das relações humanas observadas em uma dada sociedade. Ao se deparar com o flagelo da violência, é natural que opte por subutilizar os recursos disponíveis. Tal decisão pode se materializar, em casos extremos, no abandono da atividade. Não é preciso a eclosão de uma guerra, porém, para que o desempenho econômico seja afetado. Habitantes de regiões com um nível alto de criminalidade tendem a optar por "soluções de curto prazo". Estas, ainda que permitam certo alívio, prejudicam a competitividade no futuro. Daí a importância da garantia de um ambiente seguro para que os indivíduos possam tomar suas decisões de investimento.