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Fortuito malefício

POR CELSO LUIS RODRIGUES VEGRO

CELSO VEGRO

EM 17/06/2024

6 MIN DE LEITURA

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Por Celso Vegro*

Pertence à dinâmica capitalista o movimento global de acumulação – sua parte integrante e inseparável. Sobre essa dinâmica, se apoia o elemento crucial da estrutura de mercado: a concorrência, representada pelo enfrentamento de capitais plurais e rivais em busca de unidades de poder revertidas em capacidades de valorização. 

Ao se observar a formação das estruturas de mercado, duas dinâmicas são ocorrências tipicamente capitalistas: a concentração e a centralização do capital (sendo a acumulação de capital resultante do primeiro e a junção de vários capitais, do segundo). 

A formação de carteis é, tipicamente, a consequência imediata dessa dinâmica. Se, por um lado, a operação em grandes escalas potencializa a eficiência econômica, por outro, cria rigidez, expressa por desestímulo à inovação, captura de lucros extraordinários e constituição de barreiras à entrada de novos competidores (resistência à plena mobilidade do capital), em decorrência da administração dos preços que exerce.

Estabelecendo uma taxonomia de oligopólios, há aqueles que são concentrados, quando a pauta de produtos contempla rol de mercadorias homogêneas, e os competitivos, quando há captura de parcela significativa de mercado. Exemplos de oligopólios são as telecomunicações (três operadoras), os bancos (cinco com parcela maior que 80% dos depósitos totais) e o petróleo. Existem, ainda, os oligopólios naturais como a distribuição de energia e de gás, em que escalas mínimas e pré-requisitos tecnológicos são determinantes para a constituição de uma operação viável.

Ainda que inexistam ilegalidades na constituição de oligopólios, compete à administração pública a fiscalização e punição de estratégias empresariais anticompetitivas. Legislações denominadas antitrust são corriqueiras na maior parte das nações. A atuação desses órgãos é controversa, na medida em que é arbitrário a definição de um preço de equilíbrio e de uma margem de lucro compatível com as exigências de manutenção do negócio.

Trazendo esse escopo conceitual para o agronegócio Cafés do Brasil, recentemente, o Diretor Geral na ECOM assim se posicionou  durante os trabalhos do XXIV Seminário Internacional do Café, que aconteceu em maio em Santos, no painel “O excedente atual é suficientemente grande para satisfazer as necessidades do mercado”: “O Brasil cederá de 75% a 80% do café que o mundo precisa nos próximos dez anos. O Brasil foi a resposta para problemas do mundo em relação ao café. As necessidades da próxima década serão supridas pelo país e, por isso, o produtor deve ficar muito feliz”.

De fato, no curto prazo, essa imensa concentração de mercado, otimistamente prevista pelo interlocutor, pode resultar em vantagens econômicas para o cafeicultor brasileiro como para todo o agronegócio vinculado ao produto, pois, como se afirmou, uma das mazelas da formação de cartel consiste na capacidade de administrar seus preços e margens.

Numa digressão histórica, nos anos 1920, o café representava de 70% a 80% das exportações brasileiras. O produto era peça-chave na formação de reservas internacionais e na manutenção de relativa estabilidade cambial, empregando-se autoridade econômica, políticas de defesa dos preços e limitação de exportações. 

Reflexo daquele momento foi a fortíssima indução de concorrentes (abertura do guarda-chuvas), elevando rapidamente a oferta mundial, ocasionando imediata deterioração dos preços (ademais, pressionados pelo crash da Bolsa de Nova York em outubro de 1929), obrigando a destruição de milhões de sacas de café com o intuito de preservar seus preços.

Compilando dados de produção do café (arábica e canéfora) do USDA (Departamento de Agricultura dos EUA) nos últimos 14 anos (safras de 2010/11 a 2023/24 – essa última, ainda estimativa) a taxa de crescimento da produção brasileira foi de 9,03% a.a. Embora não sendo a mais elevada, pois superada pelas taxas do Vietnã e da Colômbia – que, nos anos recentes, todavia, demonstram limitações em manter o mesmo ritmo de expansão da produção no passado –, manteve-se acima da taxa média mundial calculada para o período considerado em 8,51% a.a.

Note-se que a alavancagem da liderança brasileira decorre não apenas do aprimoramento das técnicas agronômicas de produção, mas, sobretudo, da incapacidade dos demais concorrentes de prosseguir com suas respectivas trajetórias evolutivas na melhora de eficiência da lavoura, especialmente após o início da década atual. Esse descompasso (fortuito), caso se mantenha nos próximos anos, é o malefício que fará definhar o vibrante agronegócio mundial do café. 

Na atualidade, o caminho de concentração mundial da oferta de café no Brasil será acompanhado de imensos riscos. O contexto das mudanças climáticas amplifica os riscos de frustração de safras. Ademais, há continuamente o aparecimento de novas pragas e doenças que podem acarretar em substanciais perdas de produção. Por fim, existem outros riscos como os contratuais (repentina desvalorização cambial ou alavancagem das cotações não precificadas anteriormente) e legais (novas exigências, como a EUDR europeia). Tomados em conjunto, a predominância brasileira é um fator componente que magnifica riscos e coloca todo o sistema agroindustrial global do café nas bordas do precipício. 

O histórico de elevadas taxas de juros praticadas no Brasil, como mecanismo de tentativa de controle da inflação por parte da autoridade monetária, limita o acesso ao crédito necessário para implementar novas lavouras e renovar as antigas (encarecimento do custo do dinheiro expresso na forma de juros). Concomitantemente, a oferta de subvenção ao seguro rural é suficientemente robusta para suportar uma onda de novos investimentos na lavoura que, de acordo com o uso atual da terra, é, predominantemente, conduzida em número de estabelecimentos por agricultores familiares.

A perda de terroirs como os representados pelos cafés guatemaltecos, etíopes, sumatras e de tantas outras regiões do mundo é impor à atual complexidade de aromas e bebidas uma monotonia, que de forma alguma será capaz de manter o atual crescimento médio da procura pela bebida, que oscila em torno dos 2,0% a.a.

Mais grave que abrir o guarda-chuvas (hoje mais próximo de um ombrelone) e empobrecer o leque de terroirs será o estímulo ao desenvolvimento do café de laboratório, como já é o caso da empresa Atomo Coffee, cujos lemas são: “e se disséssemos que o café mais saboroso não precisa vir do grão”, “café, até a molécula”, “elaborado com amor – mas sem grãos – para ser o café mais saboroso e mais sustentável do planeta.”

A Atomo Coffee combina 28 produtos agrícolas para produzir uma xícara de café, reivindicando impacto nulo sobre o planeta. Como esclarece a empresa, sua proposta é a de superar as dificuldades de abastecimento e os impactos de sustentabilidade que assolam a indústria cafeeira. Sob tal concentração de mercado prevista pelo representante da ECOM, o marketing da Atomo Coffee associado ao ativismo dos consumidores – relutantes em favorecer um oligopólio (desconforto e indignação, juntos) –, tende a transformar profundamente esse mercado.

Se faz necessário um amplo esforço dos organismos internacionais (G7, OIC, Banco dos BRICS), em parceria com os estados nacionais, no sentido de revitalizar a cafeicultura mundial. Ao Brasil, compete exportar seu conhecimento tecnológico acumulado conduzido por técnicos especializados. Desta feita, consiste em estratégia crucial para impedir a cartelização do mercado de café o fortalecimento das instituições de pesquisa e extensão brasileiras que, juntas e ao lado do espírito empreendedor dos cafeicultores brasileiros, foram responsáveis pelo êxito alcançado por esse agronegócio.

O autor agradece ao pesquisador do IEA Vagner Azarias Martins o apoio para os cálculos estatísticos efetuados 

*Celso Luis Rodrigues Vegro é engenheiro agrônomo, mestre e pesquisador científico VI do Instituto de Economia Agrícola (IEA) da Agência Paulista de Tecnologia para os Agronegócios da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo. Para falar com o autor, escreva para celvegro@sp.gov.br

CELSO LUIS RODRIGUES VEGRO

Eng. Agr., MS Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade. Pesquisador Científico VI do IEA-APTA/SAA-SP

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