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Cotações futuras: análise da trajetória do café arábica (1)

POR CELSO LUIS RODRIGUES VEGRO

CELSO VEGRO

EM 14/11/2013

8 MIN DE LEITURA

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1 – Introdução

Estudos e evidências empíricas demonstram que a formação dos preços das commodities agrícolas exibe grande aderência às cotações desses ativos registradas nas transações que diariamente ocorrem em Bolsas de Futuros. Desse modo, acompanhar os negócios firmados com base nas cotações futuras empregadas na compra e venda dos títulos pode, desde que devidamente mediado por dados e informações de mercados conexos (moeda, juros, petróleo), oferece parâmetros relevantes para a tomada de decisão daqueles que operam nesses mercados, mais especificamente, em sua dimensão real (produzem o ativo, necessitam do suprimento).

O café arábica forma sua cotação na Bolsa de Nova York, exibindo liquidez financeira decorrente do substancial volume de contratos diariamente negociados, representando significativa quantidade de produto. Ainda que tais transações não se encerrem com liquidação no físico, exercem forte poder de estruturação desses mercados.

Existem diversas análises diárias, semanais e mensais sobre a conjuntura do mercado de café arábica circulando entre os especuladores, exportadores e industriais. Entretanto, há relativa carência de análises que orientem os produtores desses suprimentos agroindustriais. A análise da curva futura das cotações tem a pretensão de inferir sobre decisões comerciais dos cafeicultores. Sua natureza inovadora impede de assentar um desenho definitivo para a análise, sendo assim análise em processo de construção.

2 - Macrotendências

Dentre os indicadores que são sistematicamente (ou assiduamente) cotejados pelos investidores com a evolução das cotações das commodities são os mercados de juros e câmbio futuros.

Para o caso dos juros futuros, as cotações negociadas para os vencimentos de novembro de 2014 a dezembro de 2015 mostraram inclinação positiva (Figura 1). Portanto, o cenário para juros no país, na apreciação dos investidores, é de alta, negociando os contratos futuros de juros, taxa bastante acima da referencial da economia (SELIC). Evidentemente, os investidores acompanham essa informação e para optar, alternativamente pela aplicação em commodities, estas precisariam ao menos exibir ganhos que rivalizem com o esboçado em outubro pelo mercado de juros futuros.

Agregando-se a essa informação as curvas de posições futuras (médias semanais) para o contrato de dólar, constata-se que há entre os investidores percepção de valorização dessa moeda frente ao real (Figura 2). A implicação para o mercado de commodities (todas negociadas em dólar estadunidense) consiste, para a ponta compradora, no barateamento do suprimento, enquanto que, na ponta vendedora, o efeito de curto prazo é o incremento do montante recebido em moeda local, uma vez que essa se desvalorizou.


FIGURA 1 – Contratos Futuros de Juros (DI) 2015-17, BM&F-Bovespa, Média Semanal, Outubro de 2013

Fonte: Elaborado a partir de dados básicos de https://www2.bmf.com.br/pages/portal/bmfbovespa/boletim1/SistemaPregao1.asp?pagetype=pop&caminho=Resumo%20Estat%EDstico%20-%20Sistema%20Preg%E3o&Data=01/11/2013&Mercadoria=DI1


FIGURA 2 – Contratos Futuros Dólar Comercial jan. 2014 e jan. 2016, BM&F-Bovespa, Média Semanal, Outubro de 2013

Fonte: Elaborado a partir de dados básicos de https://www2.bmf.com.br/pages/portal/bmfbovespa/boletim1/SistemaPregao1.asp?pagetype=pop&caminho=Resumo Estatístico - Sistema Pregão&Data=01/11/2013&Mercadoria=DOL

A generalizada expectativa de retirada dos estímulos monetários do Federal Reserve tem conduzido à apreciação da moeda estadunidense. Esse movimento altista contribui para a saída de dólares das economias emergentes, estimulando ainda mais essa alta e, ainda, exercendo pressão baixista sobre as cotações das commodities. Ademais, como assinala Loyola (2013), essa valorização do dólar “coincide com a queda de confiança dos investidores na gestão macroeconômica brasileira e com o maior ceticismo em relação às perspectivas de crescimento de nossa economia”1.

Uma segunda repercussão do ganho de poder de compra do dólar frente ao real consiste no posicionamento dos importadores. Se tal tendência é confiável, como acredita os agentes do mercado, os compradores posicionam-se de forma a adiar ao limite suas aquisições, pois, assim procedendo, têm maior chance de comprar ainda mais barato logo à frente.

Em razão das vendas de swap cambial por parte do BACEN, em outubro a variação do dólar comercial no mercado físico (média compra e venda – PTAX) apresentou movimentos contraditórios, caindo nas primeiras três semanas do mês e subindo nas duas últimas (Figura 3). Fortalecendo-se a expectativa global de valorização do dólar, a administração da taxa de câmbio por parte da autoridade monetária se tornará mais árdua e custosa.




FIGURA 3 – Taxa de Câmbio (PTAX), Média Semanal de Compra e Venda, Outubro 2013
Fonte: Elaborado a partir de dados básicos de BACEN, 2013.

3 – Análise de Fundamentos

As curvas de cotações futuras para o café arábica registradas na Bolsa de Nova York para o mês de outubro não exibiram grande variação nas médias das três primeiras semanas. Entretanto nas quarta e quinta semanas houve deslocamento para baixo das cotações, com manutenção da tendência de alta para os vencimentos mais distantes (Figura 4).




FIGURA 4 – Cotações do Café Arábica na Bolsa de Nova York (ICE), Média Semanal, Outubro de 2013
Fonte: Elaborado a partir de dados básicos disponíveis em: www.theice.com

Na quinta semana de outubro a cotação média posicionava-se pouco acima dos US$¢116,49/lbp. Em reais essa cotação alcançaria na posição futura de julho de 2014 aproximadamente os R$359,03/sc e R$365,20 na de setembro do mesmo ano, considerando a cotação cambial para o dólar futuro da quinta semana de outubro de R$ 2,33 e R$2,37 por US$ para julho e setembro de 2014, respectivamente. Portanto, aqueles cafeicultores que tiverem custo de produção compatível com esses preços, ou seja, com captura de excedente financeiro, exibem melhores chances de atravessar o atual ciclo de baixa, ainda viáveis economicamente, desde que eles façam o hedge do café e do câmbio nas posições assinaladas ou naquela que considerar mais ajustada a sua estratégia comercial. Assim, é importante que os produtores e os formuladores de políticas públicas tenham essa baliza fornecida pelo mercado futuro, mesmo sabendo que as expectativas se renovam diariamente.

Ao se cotejar as expectativas econômicas globais e as específicas do Brasil com os fundamentos para o mercado de café, constata-se que o conjunto dos fatores exerce acentuada pressão baixista. O fluxo comercial da oferta dos centro-americanos e colombianos, esses últimos recuperando produção acima das 10 milhões de sacas, associado com a elevada safra de ciclo de baixa no Brasil (quase 49 milhões de sacas, segundo a CONAB) e as notícias de que no Vietnã a colheita possa superar 27 milhões de sacas, permite construir cenário de incremento de produto remanescente no mercado mundial ao encerramento da corrente temporada (2013/14).

Clima favorável e bons tratos culturais oferecidos às lavouras em safra anterior produziram intensas floradas nos mais diversos cinturões cafeicultores. Essa informação reverbera no mercado, com formação de expectativas entre os agentes privados, de farta colheita no Brasil, oscilando entre as 53 a 55 milhões de sacas a serem colhidas na safra 2014/153. A menos que ocorram desastres climáticos de elevada envergadura, a tendência de expansão de excedentes se mantém, arrefecendo qualquer estimativa altista para os contratos de café arábica.

Preocupados com a regulação do mercado de futuros estadunidenses, autoridades da Intercontinental Exchange (ICE) e da Commodity Futures Trading Comission (CFTC), pretendem promover mudanças nas regras como a limitação para a tomada de decisão privada por meio de programas de algoritmos e travas para grandes investidores (máx. de 25% de posição comprada e vendida no curto prazo, diminuindo o percentual para posições de mais longo prazo)4. Tais mudanças podem agregar maior transparência e equidade para as negociações, impedindo ações lesivas (manipulação) aos investidores, especialmente, pequenos aplicadores.

A expectativa em torno da valorização do dólar repercute no interesse pelas transações envolvendo o ativo. Os contratos capitaneados pelos fundos e grandes investidores associados aos traders (comércio e indústria) e pequenos aplicadores exibiram saldo semanal negativo no balanço de compra e venda (excetuando-se a quinta semana entre pequenas posições). Apenas as carteiras que atuam com índice continuam carregando na carteira contratos de café arábica, exibindo maior volume comprado do que vendido (Tabela 1). Como a participação das softs commodities (grupo ao qual pertence o café) geralmente não ultrapassa os 5% da carteira, é possível que o declínio das cotações esteja sendo compensada por outros ativos que trafegaram em sentido inverso.

Destaca-se a posição liquidamente vendida dos grandes investidores e fundos especulativos, que aumentou na última semana de outubro de 2013 para 37 mil contratos. Tal fenômeno significa que os grandes especuladores continuam acreditando na queda dos preços do café, sendo provável que essa percepção esteja associada à desvalorização cambial, tanto no Brasil quanto nos demais países produtores.

TABELA 1 – Posição Semanal dos Contratos na Bolsa de Nova York, Futuros + Opções, Outubro de 2013


Fonte: Elaborado a partir de dados básicos disponíveis em https://www.cftc.gov/

Entre os fundos e grandes investidores a posição de máximo no volume líquido foi alcançada em 12/02/2008, quando se contabilizava 56.205 contratos comprados acima dos vendidos, antecipando a escalada altista que atingiu seu pico em meados de 2011.

A fuga dos contratos de café em Nova York pode estar vinculada à busca de valorização do patrimônio por meio de títulos em dólar, beneficiando de possível ganho de poder de compra dessa moeda no curto e médio prazos. Ademais, relatório recente da Organização Internacional do Café estima que o suprimento global tenha crescido 9,6% frente à temporada anterior, transitando o consumo no patamar de 2,4% de expansão ao ano, o que fará incrementar os estoques, adicionando pressão baixista ao ativo e legitimando ainda mais a saída dos especuladores5. No atual ritmo de seguidas baixas para o produto, alcançar cotações abaixo dos US$¢100,00/lbp em novembro não será grande surpresa.



Figura 5 – Trajetória do Diferencial entre cotações em segunda posição da ICE e BM&F-Bovespa, média semanal, outubro 2013

Fonte: Elaborado a partir de dados disponíveis em www.theice.com e www.bmfbovespa.com.br

O contrato futuro na Bolsa de NY estabelece diferencial de US$¢9,00/lbp para café brasileiro lavado ou cereja descascado. Em outubro de 2013, a trajetória do diferencial esteve em queda, sendo essa talvez a única informação altista para o produto brasileiro no atual cenário para o mercado do ativo. Duas possibilidades para essa queda: a) queda acentuada das cotações atraiu especuladores que perceberam oportunidades comerciais em adquirir a origem; b) agressividade nas exportações de centro americanos e colombianos que estão aceitando menores prêmios para sua origem e, ainda, c) aumento do interesse de torrefadores pelo café brasileiro que oferece maleabilidade necessária na composição de suas ligas.

1Os autores agradecem pelo trabalho de sistematização do banco de dados econômicos conduzido pelo agente de apoio a pesquisa científica e tecnológica do IEA o analista de sistemas Paulo Sérgio Caldeira Franco.
2 Utilizando-se o multiplicador 1,3228, faz-se a conversão de US$¢lbp para US$60kg. Após aplicar a taxa de câmbio assinalada encontra-se a cotação em reais.
3LOYOLA, Gustavo. Quem avisa amigo é. Jornal Valor Econômico, 04/11/2013.
4 Ver a apresentação de especialista da CONAB sobre previsão da próxima safra. Disponível em: https://www.conab.gov.br/OlalaCMS/uploads/arquivos/13_09_12_17_54_48_12_cafe.pdf
5 BARABACH, Gil. Preços voltam a recuar em outubro. Safras e Mercados - Boletim semanal, n. 773, ano XIV, 07/11/2013.
6 Maiores detalhes consultar: https://dev.ico.org/documents/cy2012-13/cmr-0913-p.pdf

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CELSO LUIS RODRIGUES VEGRO

Eng. Agr., MS Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade. Pesquisador Científico VI do IEA-APTA/SAA-SP

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RENATO H. FERNANDES

TEIXEIRA DE FREITAS - BAHIA - COMÉRCIO DE CAFÉ (B2B)

EM 26/11/2013

Caros Celso e Fred,



Como Celso muito bem exprimiu, a atuação de fundos de investimento, negociando papéis para cuja entrega física seria necessária por multiplicar algumas vezes a produção mundial de café, gera distorções significativas no mercado físico.



Por outro lado, eu entendo que a possibilidade de garantir boa parcela de sua necessidade de consumo comprando de produtores mais competitivos e que têm reais condições de cumprir os contratos de venda a termo, dá a quem necessita realmente adquirir café a possibilidade de suprimento sem necessidade de exprimir os fundamentos de mercado físico (4 milhões é realmente um excedente bem parco mesmo), simplesmente surfando na onda baixista.



Para os produtores que travaram os preços em patamares mais elevador (vale salientar que para uma boa parcela destes a atual conjuntura de preços ainda é remuneradora) a atividade continua interessante. Isto previne contra a ocorrência déficits de oferta a curto prazo. Tal parcela dos produtores é pequena em número, mas, cada vez, mais expressiva em produção. Chamo esse fenômeno, pura e simplesmente, de elevação do patamar de competitividade.



Acredito também que a situação atual está realmente distorcida, porém tal qual, ou mesmo menos, que na alta de 2011.



Abraços,



Renato
CELSO LUIS RODRIGUES VEGRO

SÃO PAULO - SÃO PAULO - PESQUISA/ENSINO

EM 18/11/2013

Amigo Frederico

Tenho dívidas consigo. Minha estada em terras capixabas foi das mais produtivas e deixará lembranças. Grato pelo convite e pelo acolhimento.

Veja, você faz perguntas que martela em todas nossas cabeças. Como um excedente miserável de 4 milhões de sacas pode causar tanto estrago em um mercado que consome 143? Na verdade os agentes econômicos atuam precificando o futuro e pelas atuais condições a possibilidade que na safra 2014/15 esse patamar de 4 milhões e estoque supere os 10 milhões de sacas é muito provável. Diante disso os agentes se antecipam buscando vantagens econômicas imediatas.

É uma explicação parcial do fenômeno. A crise econômica nos países centrais é outra possibilidade a ser explorada. Entretanto sua lógica é bastante pertinente, não tardará o momento em que a situação se inverterá e o comportamento dos agentes econômicos será a da corrida pelo produto catapultando seus preços como foi em 2011.

Um grande abraço

Celso Vegro
FREDERICO DE ALMEIDA DAHER

VITÓRIA - ESPÍRITO SANTO - PROFISSIONAIS DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS

EM 18/11/2013

Prezado Celso Vegro;

Brilhante e denso o conteúdo do seu estudo.Parabéns!

Entretanto,um dado real me intriga.

O consumo mundial de café vem crescendo em torno de 2,5% a.a. e a produção 1,8% a.a.,embora sazonalmente esses valores possam se alterar para mais ou para menos.Num cenário de longo prazo sempre haverá defasagem entre consumo e produção.Nada me autoriza a crer que teremos sempre café em abundância.Como explicar a posição de curtíssimo prazo dos agentes de mercado?

Como retirar o café da lista de commodities?

Grande Abraço

Frederico

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