Nas bolsas em que o produto é negociado, em agosto de 2008, observaram-se ligeiras quedas na média das cotações frente ao mês anterior. Em Nova Iorque (contrato C em segunda posição - em US$/sc.), por exemplo, a cotação média do mês foi de US$ 188,38/sc contra US$ 188,94/sc em julho, ou seja, 0,29% de declínio. O incremento dos embarques de nossos concorrentes foi parcialmente compensado pelo retraimento das negociações no Brasil, induzindo o mercado a essa relativa estabilidade.
Acompanhando Nova Iorque, na BM&F/Bovespa, a média das cotações de agosto ficou em US$ 171,43/sc, com perdas de -0,57% no mês. Maiores perdas foram registradas nas cotações do robusta na Bolsa de Londres com queda de -2,85%, refletindo justamente a intensificação dos embarques vietnamitas observados em agosto. Contabilizadas todas essas perdas, o índice composto da OIC para agosto exibiu declínio de -1,23%, com média ponderada de US$ 173,47/sc (Figura 1).
Figura 1 - Cotações médias mensais do café em diferentes mercados de futuros (segunda posição) e do OIC-Composto diário, janeiro de 2004 a agosto de 2008.
Fonte: Elaborada a partir de dados da Gazeta Mercantil2
Entre janeiro e agosto de 2008, as cotações exibiram melhores ganhos para o robusta com 15,87% de variação positiva, na Bolsa de Londres, e o pior resultado para o arábica BM&F/Bovespa, com apenas 2,51% de aumento. Considerando os últimos 12 meses, as cotações se elevaram em 19,26% em Nova Iorque e em 21,04% para os preços recebidos pelos cafeicultores paulistas (Tabela 1).
Tabela 1 - Variação nas cotações médias do café, set/2007 a ago/2008 (em US$/sc 60kg)
Fonte: Elaborado a partir de dados básicos da Gazeta Mercantil.
2 - Pepro II: ter por meta o êxito
Por pressuposto, os fundamentos para a proposição de políticas públicas estão associados à capacidade de selecionar, dentre as diferentes alternativas (não somente as possíveis como as plausíveis), aquela(s) que melhor contribuem para o crescimento econômico e desenvolvimento, traduzido pela consubstanciação de patamar mais elevado de bem-estar, e cimentado por menos acentuado grau de heterogeneidade social, fenômeno tão característico do tecido social brasileiro.
Diante dessas premissas é que se permite analisar se o Prêmio Equalizador Pago ao Produtor (Pepro), em sua edição anterior, atingiu as metas precípuas de uma boa política. Em análises anteriores, destacou-se que seus vícios de origem (erro de oportunidade, baixa abrangência e desenho deficiente)3, o impediu de alcançar bom termo. Para confirmar tal assertiva, averigúe-se o intenso debate sobre o assunto travado na mídia especializada nos últimos meses4.
Para a nova edição do Pepro compete tecer outros detalhamentos relevantes, sempre tendo por meta o êxito da política. Assim, podem-se aplicar algumas hipóteses para avaliar a consistência da política, como: desvio de foco; nível de interferência no funcionamento do mercado; transparência; grau de burocratização e gestão.
Na primeira versão do prêmio houve imensa perda de foco ao se permitir o livre acesso de imenso número de cafeicultores empresariais ao subsídio pago pelo Tesouro. Nessa nova edição se poderia vincular a compra dos contratos de prêmio apenas para os cafeicultores adimplentes junto ao Funcafé e demais carteiras de financiamento rural. Em análise anterior, comprovou-se que os pequenos empréstimos, de até R$ 10 mil possuem menos de 2% de inadimplência enquanto que os acima de R$ 500 mil, mais de 30%. Assim, seria dado o primeiro passo para a criação do cadastro positivo da cafeicultura, com acesso ao Pepro apenas dos cafeicultores adimplentes e cujas amortizações estão em dia.
O Pepro carrega, intrinsecamente, grande interferência no funcionamento do mercado. O fluxo de comercialização do qual dependem outros importantes elos do agronegócio (exportadores, corretores, torrefadores e solubilizadores) beira o colapso, pois se cria um clima de expectativas de preços futuros mais compensadores (evidentemente pejado pela certeza de captura do subsidio) e assim paralisação imediata dos trâmites comerciais. Ao interferir no mercado, ensina a boa economia, são criadas assimetrias em que justamente aqueles que mais necessitam do apoio concedido pela política pública, são os que menos delas se beneficiam. Também perdem os cafeicultores empresariais, pois na expectativa de adquirir seus contratos de Pepro deixam de se proteger pelos tradicionais mecanismos de hedge em Bolsa, contribuindo assim, a política, para um desaprendizado dessa importante ferramenta de gestão da comercialização.
O terceiro elemento fundamental dessa estrutura de análise traduz-se pela transparência de mercado. O prêmio em sua versão anterior, ao atender preferencialmente as cooperativas de cafeicultores, tornou o desembolso uma verdadeira caixa preta, impossível inclusive de ser auditada, como pleiteiam os representantes do Cecafé5. Diante desse incomensurável erro anterior não seria pertinente propor uma nova modalidade de leilão dos contratos aproveitando-se da estrutura absolutamente eficaz e transparente executada pelo Banco do Brasil em seus rotineiros leilões de cafés pertencentes aos estoques públicos. Por meios eletrônicos, qualquer torrefadora do país pode se credenciar à aquisição dos lotes oferecidos e os lances podem ser acompanhados por todos os participantes do aviso de venda. Com a maior facilidade desse mundo, poderia o mesmo sistema ser empregado nos leilões de contratos do Pepro e a própria instituição financeira, a receptora dos depósitos referentes a cada contrato negociado. Sistema limpo, claro, transparente, como recomenda a boa política.
Ao ser implementado pela Conab, a versão anterior do Pepro foi eivada por excesso de burocracia. Enorme contingente de cafeicultores, especialmente os familiares não participantes de cooperativas de produção, praticamente não teve como participar dos leilões, criando-se assim um privilégio absolutamente espúrio. A desburocratização é uma exigência para a eficácia da política e para isso bastam poucas medidas como a verificação da adimplência do CPF do adquirente junto ao Cadin para o credenciamento da aquisição, por exemplo.
Finalmente alcançamos a problemática da gestão. Em se tratando de um subsídio concedido pelo Tesouro aos cafeicultores que adquirirem os contratos por meio do pagamento do respectivo prêmio associado, a estrutura que mais bem pode gerir essa política é a burocracia de governo, ou seja, técnicos devidamente habilitados relativamente imunes à ação de lobbies interessados em capturar privilégios para qualquer uma das partes envolvidas. Em se tratando de dinheiro público, derivado do recolhimento de impostos, somente uma gestão eminentemente pública pode lograr o pretendido êxito no desejável esforço de proteção da renda dos cafeicultores.
3 - Carência de discernimento
Elevam-se as cotações dos fertilizantes a patamares jamais vistos. Fatores de toda a sorte contribuíram para que a atual escalada de preços se acentuasse. Desde a especulação financeira com as commodities (petróleo, metálicas e agrícolas), até a crise imobiliária estadunidense com depreciação global da cotação do dólar e risco de colapso de inúmeras instituições financeiras, pressionaram as cotações dos fertilizantes, e de seus ingredientes estratégicos, para as alturas.
Diante de tais cotações, absolutamente desconfortáveis para os produtores agrícolas, a estrutura de governo (presidente, ministro, assessores) se mobilizou para encontrar alternativas capazes de mitigar os impactos anunciados sobre os custos de produção6. Todavia, o que verdadeiramente prevaleceu nas opções apresentadas, foi uma imensa insensatez, permeada de tentativas de pressionar o setor privado em acelerar os investimentos na produção de fertilizantes, rumo a uma auto-suficiência almejada para o prazo de cinco anos. Alcança-se então o apogeu da insensatez quando o ministro afirma que partirá para a criação de empresas públicas dedicadas à atuação no segmento caso o seu prognóstico não se confirme, ou seja, uma volta ao passado antes do ciclo das privatizações7.
A oferta de jazimentos minerais, por si só, não permite o barateamento do preço final dos fertilizantes. Existe por detrás do produto uma série de transformações industriais em que alguns insumos são absolutamente estratégicos, nos quais o Brasil ainda encontra-se longe da auto-suficiência. São eles: gás natural, ácido fosfórico e ácido sulfúrico.
Ingrediente essencial para a produção de ácido fosfórico, o fósforo (ou P205) é combinado com a rocha fosfatada e ao ácido sulfúrico para produzir o fertilizante fosfatado8. As importações desse elemento se intensificaram após 2006, sendo que somente no primeiro semestre de 2008, tais transações se assemelham ao total negociado em 2006, evidenciando falta crônica de instalações industriais capazes de suprir repiques da demanda pelo nutriente, uma vez que a produção em 2008 deverá alcançar os mesmos patamares da observada no ano anterior (2,1 milhões de t) (Figura 2).
Figura 2 - Produção e Importação de Fósforo, Brasil, 2006, 2007 e jan-jun/2008.
Fonte: Boletim SIACESP9, vários números
Para o enxofre, ingrediente estratégico para a fabricação do ácido sulfúrico, a história se repete. Entre janeiro a junho de 2008, as importações atingiram 1,17 milhões de toneladas contra 950 mil toneladas importadas no mesmo período do ano anterior desse nutriente, ou seja, crescimento de aproximadamente 18% na comparação entre os períodos (Figura 3).
Figura 3 - Importação de Enxofre, Brasil, 2007 e jan-jun/2008.
Fonte: Boletim SIACESP, vários números
Tanto o ácido fosfórico como o sulfúrico são commodities. As cotações internacionais desses ácidos, em 2008, exibem significativos aumentos. O ácido fosfórico que era cotado em janeiro a US$ 460/t FOB, valia em junho US$ 1.875/t, ou seja, quatro vezes o valor inicial em apenas seis meses! Mais comportadas, as cotações do ácido sulfúrico também subiram, saltando de US$ 230/t para US$ 260/t entre janeiro e junho de 200810.
Outro importantíssimo insumo estratégico na produção de fertilizantes nitrogenados é o gás natural. Atualmente, o abastecimento da demanda brasileira de gás é quase que integralmente suprida pelas importações do produto boliviano. Recentes descobertas no litoral, a poucos quilômetros da costa da cidade de Santos, deverão propiciar a auto-suficiência na oferta do produto. Entretanto, os investimentos da Petrobras para operar nesse campo sequer começaram e, o achamento de outras tantas reservas de petróleo na mesma região de prospecção, introduziram um fortíssimo viés político quanto à forma de explorá-los que deverá atrasar ainda mais os investimentos na construção das plataformas11.
Enquanto as autoridades não definem o modelo que será empregado para explorar as reservas (gás e petróleo), a nação brasileira, especialmente, os agricultores que necessitam de fertilizantes para conduzir suas explorações agrícolas, continuarão a pagar mais pelos adubos, pois suas cotações internacionais continuam em ascensão. No caso dos fertilizantes nitrogenados, as cotações têm sido puxadas pelos preços do gás natural que acarretaram despesas com importações ao país da ordem de US$ 1,40 bilhão entre janeiro a junho de 2008 (preço médio do semestre de US$ 239,00/1.000 m3). Comparativamente, em todo o ano de 2007 as despesas com gás natural atingiram US$ 1,78 bilhão (preço médio de US$ 159,23/1.000 m3). Os preços subiram simplesmente por que não há oferta de gás em volume suficiente para atender, inclusive, a demanda das indústrias de fertilizantes (Figura 4).
Figura 4 - Importação de Gás Natural, Brasil, jan-jun de 2007 e 2008.
Fonte: Agência Nacional do Petróleo12
Diante dessas reflexões o que se pode concluir:
a) disponibilidade de jazimentos não se traduz em abundância de oferta de fertilizantes a preços competitivos;
b) existe imensa carência de investimentos públicos e privados no segmento de exploração mineral voltada para a produção de fertilizantes;
c) o debate sobre o grau de concentração do mercado é absolutamente irrelevante, pois a tecnologia de produção é totalmente madura e dominada, ou seja, inexistem barreiras à entrada de novas companhias interessadas no negócio excetuando-se a magnitude dos investimentos exigidos (que venham os chineses);
d) as poucas iniciativas de ampliação de capacidade instalada somente trarão impactos na oferta a médio prazo;
e) a insuficiência da produção doméstica de insumos estratégicos impede a formulação de qualquer política de ordenamento do mercado;
f) mesmo adotando algum tipo de subvenção ao produto, muito dificilmente as empresas, especialmente, a Petrobras, implantarão política de preços que não acompanhe as cotações internacionais para os recursos explorados em território nacional.
4 - Um adágio para a reflexão
Machado de Assis, Esaú e Jacó. W.M. Jackson Inc. Editores, 1946.
1 o Autor agradece as sugestões do Prof. Dr. Felix Schouchana da FGV/SP e a Gilberto Bernardi na colaboração na coleta e sistematização dos dados básicos.
2 Disponível em www.gazetamercanil.com.br (para assinantes).
3 Detalhes em:
VEGRO, C.L.R. Café: decisões adaptadas as conveniências do pecúlio. Revista eletrônica Análises e Indicadores do Agronegócio, out.2007. disponível em www.iea.sp.gov.br.
VEGRO, C.L.R. Café: estariam as cotações refletindo a ausência de precipitações? Revista eletrônica Análises e Indicadores do Agronegócio, out.2007. disponível em www.iea.sp.gov.br.
4 PIRES FILHO, G.B.A. Pepro, um programa marcado por desvios e distorções. Centro do Comércio do Café do Rio de Janeiro. Revista do Café, ano 87, n.826, junho 2008, 4-5p.
5 LOBATO, E. Exportador acusa desvio em verba de café. Folha de São Paulo, Caderno Dinheiro, 24/08/2008. LIAN, J. A. O cooperativismo e o Pepro, segundo o Cecafé. Gazeta Mercantil, Agronegócio, 14/08/2008. Pepro: sugestões sobre as normas que devem disciplinar o Programa e constar dos Avisos. Documento encaminhado pelo Cecafé à Conab (mimeo).
6 DURÃO, V.S.; LOPES, F. & VIEIRA, A. Pressão do governo acelera projetos na área de fertilizantes. Jornal Valor Econômico, 25/06/2008, p.B12.
7 A baixíssima qualidade das instituições no Brasil traz um grande temor quanto ao possível desempenho de empresas estatais ou outros tipos de autarquias que vierem a produzir fertilizantes ou explorar as jazidas de alto mar.
8 A Vale não pretende voltar a produzir fertilizantes no Brasil. Sua iniciativa está, atualmente, direcionada para a exploração de jazimentos fosfatados no Peru (DURÃO, et al, 2008). Portanto, qualquer transferência da futura produção naquele país para o Brasil se dará tendo em conta as cotações internacionais do produto.
9 Consultar www.siacesp.com.br.
10 Ao final de agosto a Câmara de Comércio Exterior reduziu as alíquotas de importação dos ácidos fosfóricos e sulfúrico que até então eram de 4%.
11 SCHUFFNER, C. Produzir mais fertilizantes depende da oferta de gás. Jornal Valor Econômico, 25/08/2008, p. A2. A notícia informa que as instalações produtoras de uréia da empresa não poderão ser ampliadas por atraso no cronograma de conclusão das obras do gasoduto que levaria o produto até a região nordeste.
12 Ver: www.anp.gov.br.