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A insana teimosia

POR CELSO LUIS RODRIGUES VEGRO

CELSO VEGRO

HÁ UM DIA

6 MIN DE LEITURA

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Por Celso Vegro*

Da perspectiva econômica clássica, o desenvolvimento sustentável vincula-se ao incremento concomitante de três elementos cruciais: produtividade da terra, do capital (máquinas, equipamentos e investimentos) e do trabalho. A progressão desses componentes da função de produção é o que promove o desenvolvimento.

Trazendo essa perspectiva para o agronegócio café, além dos alicerces econômicos mencionados, há que se acoplar outras dinâmicas que são vetorizadas por contextos internacionais. Talvez, aquelas de maior relevância sejam: a) a transição da pauta do comércio mundial do eixo Atlântico para o eixo Pacífico e b) o impacto das mudanças climáticas. Na primeira, é preciso se ajustar às novas demandas decorrentes dos diferentes hábitos de consumo de europeus e estadunidenses (eixo Atlântico) para asiáticos (nota 1, ao final da coluna) — com exceção do Japão, que já avançou bastante na ocidentalização de sua sociedade (eixo Pacífico).

Essa prevalência do eixo Pacífico para a dinâmica do comércio internacional tem sido um impulsionador das exportações de commodities, capturando, o Brasil, um market share expressivo nesse amplo mercado, particularmente o chinês. A demanda por café tem muito a se expandir entre asiáticos, que, atualmente, é o motor dessa expansão. Dos 1,7% a 2,2% de crescimento anual médio da demanda por café, aproximadamente 2/3 tem origem na demanda dos países do eixo Pacífico.

Há amplo conhecimento da porta de entrada do café entre asiáticos, sendo o solúvel e as misturas prontas (cappuccino e solúvel com leite em pó) as preferências desse mercado. Dessa constatação emerge a necessidade de rever a trajetória para a expansão da cafeicultura brasileira.

Nas últimas duas décadas tem havido uma concentração de ofertantes no mercado mundial de café, com consequências relevantes para o fluxo de suprimento internacional. Entre os asiáticos, o Brasil encontra dois importantes concorrentes: Vietnã e Indonésia (nota 2), países que possuem importante parque cafeeiro destinado, majoritariamente, ao abastecimento europeu e estadunidense.

Porém, as mudanças climáticas que causam, atualmente, graves problemas para a cafeicultura brasileira (geada, estiagem), também foram vivenciadas por ambos os países asiáticos  (passagem de tufão), levando-os a uma queda expressiva de produção de robusta na corrente safra (nota 3). Com contratos sendo paulatinamente encerrados e sem produto para efetuar as entregas, as cotações do café tiveram crescimento exponencial.

Ademais, existem as dificuldades em mobilizar mão de obra para atuar no manejo e colheita dos cafezais. O acelerado ritmo de industrialização e urbanização que pauta o crescimento econômico do Vietnã e da Indonésia atrai grandes contingentes da força de trabalho rural para os centros urbanos. Diferentemente do Brasil, em que as máquinas constituem elementos fundamentais da paisagem cafeeira, nos países asiáticos prevalecem as pequenas unidades de produção, sem escala suficiente para a introdução de máquinas, repercutindo em baixa produtividade da terra e do trabalho.

No Brasil, a expansão da produção de canéfora (conilon e robusta) é uma realidade. Entre 2008 e 2024, a média de área nova de arábica somou 306 mil ha ao ano, sendo que o canéfora, no mesmo período, alcançou a média de 384 mil ha ao ano — portanto, cerca de 80 mil ha a mais que o arábica!

No mesmo período, a média da área nova de canéfora foi 64% superior à do arábica, ainda que nos últimos anos da série as áreas tenham se aproximado. Em termos de taxa geométrica de crescimento anual, os resultados da série são de 4,71% ao ano para o arábica e de 2,25% ao ano para o canéfora (figura 1). Embora a taxa seja mais elevada em arábica, o percentual de renovação é maior também nessa lavoura, enquanto no canéfora prevalecem os novos plantios. Aparentemente, os cafeicultores já demonstram que essa é a opção mais sustentável a seguir.

As ofertas rondonienses e baianas complementam os grandes volumes oriundos do território capixaba. Novas áreas são angariadas para a introdução da cafeicultura do canéfora como, por exemplo, a Alta Paulista e o Vale do Ribeira. Além do crescimento da área dos canéforas frente ao dos arábicas, os primeiros exibem, em geral, produtividades médias muito superiores.

Figura 1 – Área nova de café no Brasil, 2008 a 2024

Fonte: Elaborado a partir de dados básicos de CONAB (2024)

 Em 2024, a escalada das cotações dos canéforas foi tão surpreendente que rapidamente ultrapassou as cotações do arábica riado e, depois dos duros, e, mais recentemente, até dos cafés de bebida mole (gourmet e especiais). É um momento de hipervalorização do produto que promoveu uma verdadeira inversão de papéis.

Está em curso uma mudança significativa na dinâmica do mercado, com duas vertentes fundamentais: arábicas de qualidade para consumidores mais exigentes e canéforas para a massa da população (asiáticos). A definitiva consolidação do Brasil em termos de plataforma de negócios em café demanda exata compreensão desse fenômeno, em que a demanda crescente estará centrada, especialmente, no canéfora.

Áreas com altitudes limítrofes para o cultivo de arábica deveriam ser convertidas, prioritariamente, para a produção de canéforas, por exemplo. Devem ser criados fortes incentivos para a implementação de lavouras nas áreas de fronteira para o canéfora (inclusive validando o êxito dos cultivos em altitude), já desenhadas para atender às normativas da Lei Antidesmatamento da União Europeia (EUDR) e alinhadas às diretrizes do mercado de créditos de carbono.

O Brasil precisa aumentar acentuadamente a produção de canéfora, para se alinhar à dinâmica prevalecente no mercado internacional (nota 4). Porém, o verdadeiro êxito dessa expansão depende de um conjunto de estratégias articuladas, como sistemas de produção diversificados com perfil familiar, crédito para irrigação, maior volume de recursos para a subvenção do seguro rural, investimentos em treinamento contínuo e capacitação (em parceria com o Senar, Sebrae e Emater) e estruturação do mercado de contratos futuros no país (felizmente já implementado pela B [3]).

A liderança em arábica é um trunfo brasileiro há mais de duzentos anos. Aumentar a produção de canéfora não colide com essa reputação. Se o comércio mundial de café está bem distribuído entre arábica e canéfora (50% para cada um), essa deve ser a meta para a safra brasileira também. Insistir em privilegiar o cultivo de arábica parece teimosia, enquanto o potencial de mercado do canéfora tem se mostrado mais relevante em termos de preços, produtividade e potencial de áreas passíveis de serem mobilizadas visando receber novas lavouras.

Para impulsionar o desenvolvimento dos cinturões cafeeiros do Brasil, a alavancagem em canéfora é atualmente a mais acertada diretriz a seguir. Que miremos em 50 milhões de sacas para cada uma das espécies. Tecnologia, conhecimento, empreendedorismo e vocação para produzir com qualidade não nos faltam. Promover a cafeicultura se traduz em gerar desenvolvimento, verdadeiros irmãos siameses.  

*O autor agradece a colaboração do estatístico e pesquisador científico do IEA Vagner Azarias Martins no processamento de dados e cálculos efetuados.

*Celso Luis Rodrigues Vegro - Eng. Agr., MS, Pesquisador Científico VI do IEA celvegro@sp.gov.br

______________

Nota 1: especialmente China, Índia e Indonésia, países populosos em que um aumento de apenas 100 g no consumo per capita de café representaria, ao menos, mais 5 milhões de sacas na demanda mundial.

2 As exportações de café do Vietnã, nos primeiros oito meses deste ano, somaram 1,056 milhão de toneladas métricas, uma queda de 12,1% em relação ao ano anterior, segundo dados da alfândega divulgados em 11/9. Disponível em: https://www.noticiasagricolas.com.br/noticias/cafe/384675-exportacoes-de-cafe-do-vietna-caem-121-de-janeiro-a-agosto.html. Acesso em 12/09/2024.

Por sua vez, “a Volcafé projeta um déficit global para os canéforas de 4,6 milhões de sacas em 2024/25, um déficit menor do que o déficit de 9 milhões de sacas visto em 2023/24, mas será o quarto ano consecutivo de déficits do canéfora. Ademais, as exportações reduzidas de café do Vietnã, o maior produtor mundial de canéforas, também dão sustentação ao mercado”. Boletim Procafé. Disponível em: https://e326244a-ec26-4337-83ca-9389b084c1a2.usrfiles.com/ugd/e32624_0e3d44b8f056494d8594c19e7c004f1b.pdf. Acesso em 12/09/2024.

3 A Indonésia avança rapidamente para se tornar um novo país importador, dada a expansão do consumo doméstico. A Indonésia se destaca como maior importador de solúveis: desde janeiro, foram 161.553 sacas. https://www.cafepoint.com.br/noticias/giro-de-noticias/belgica-e-o-maior-comprador-do-conilon-capixaba-deste-ano-237444/. Acesso em 12/09/2024.

4 Os recentes investimentos em novas plantas agroindustriais de solubilização no Brasil reposicionam o segmento no agronegócio nacional e asseguram uma inserção internacional ainda mais sólida e sustentável.

CELSO LUIS RODRIGUES VEGRO

Eng. Agr., MS Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade. Pesquisador Científico VI do IEA-APTA/SAA-SP

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