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Drawback: em benefício de quem?

POR SYLVIA SAES

E BRUNO VARELLA MIRANDA

BRUNO VARELLA MIRANDA

EM 20/07/2007

5 MIN DE LEITURA

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O debate é antigo, porém volta e meia é revivido em diversos círculos ligados à cafeicultura. O drawback, defendido ou combatido de maneira intensa por agentes envolvidos no setor, está por trás de parcela considerável da atual dinâmica do mercado cafeeiro. Compreender o que está em jogo nesta discussão é fundamental para qualquer observador, esteja ele envolvido com a produção, a transformação ou a comercialização do café.

De forma resumida, o drawback é um regime aduaneiro especial, concedido quando comprovada uma possibilidade de ganho para o Brasil. Sua instituição garante a eliminação de tributos sobre a importação de insumos, desde que os mesmos sejam utilizados em um produto posteriormente exportado. Ou seja, em sua origem o drawback vem para promover a indústria exportadora brasileira, garantindo o fornecimento de matéria prima a preços competitivos.

Em muitos setores, a concessão de drawback é comemorada, já que permite a inserção brasileira em diversos segmentos do comércio internacional. No entanto, quando se discute a possibilidade de drawback no café, estamos longe de qualquer unanimidade. Ambos os lados do debate têm seus argumentos, em sua maioria esmagadora, válidos. Na realidade, nenhum cenário é perfeito, e a medição de prós e contra deve ser o norteador de qualquer decisão neste tema.

No plano internacional, o drawback no café é uma prática disseminada, conforme diversos exemplos o comprovam. Grandes reexportadores, como a Itália, importam cafés de diversas regiões do mundo, compondo blends apreciados posteriormente por consumidores com gosto sofisticado. Para os países europeus, por exemplo, a inexistência de produção interna faz com que a enorme abertura para a importação de café verde não represente um ponto polêmico. Em meio a este ambiente, marcas vêm se consolidando há décadas, baseadas na constituição destes blends, muitos dos quais detentores de um mercado cativo.

De fato, é interessante observarmos que a posse das marcas de café mais valiosas se concentra nos países desenvolvidos, bem como as principais empresas responsáveis pela comercialização do produto. Indo além, estas transações se dão sob uma concentração crescente, de modo que na atualidade pouquíssimas companhias são responsáveis pelo grosso da compra de café junto aos produtores. Neste contexto, países como o Brasil são cada vez mais vendedores de um ingrediente, cuja existência é essencial para a elaboração das mais diversas receitas, mas com uma valorização abaixo da esperada. Afinal, o que chega aos consumidores é o café já empacotado, o produto final, e é a marca o principal diferencial da mesma.

Por outro lado, países em desenvolvimento abrem seus mercados à entrada de café robusta asiático, em busca da consolidação de um parque industrial voltado para a produção de café solúvel. Nos últimos anos, vem aumentando o número de países com estrutura para a produção de um dos artigos com maiores perspectivas nos próximos anos. O crescimento da demanda por café na Ásia, sobretudo empurrada pelo consumo doméstico, é uma excelente notícia para o segmento de café solúvel, cada vez mais espalhada ao redor do mundo.

Tradicionalmente, nos agarramos à nossa reputação de maior produtor mundial para refutar a adoção do drawback no caso do café. Inclusive, não são poucos os argumentos contrários a uma mudança na legislação. Afinal, um país com tantos cafezais não deveria permitir a concorrência de um produto que em muitos casos deriva sua competitividade do desrespeito a padrões trabalhistas e ambientais, ou que possui uma qualidade inferior ao café produzido internamente. Políticas restritivas fazem inclusive parte da rotina da grande maioria dos países do mundo, de modo que a colocação de barreiras em um setor estratégico como o café defenderia milhares de empregos.

Na realidade, o mercado internacional é bem mais complexo, e em alguns casos exige respostas que a cafeicultura brasileira seria incapaz de garantir solitariamente. Conforme citamos, os hábitos de consumo no "primeiro mundo" muitas vezes se ligam a blends compostos por cafés oriundos de diversas regiões. O Brasil, com toda a sua diversidade na produção, é parte de elaboradas receitas, porém em raros casos é o componente exclusivo. Nesse sentido, permitir o drawback pode abrir espaço para a consolidação de marcas nacionais, que explorem esta característica do mercado internacional.

No que se refere ao segmento de cafés solúveis, a existência do Vietnã é por si só uma garantia de matéria-prima a preços competitivos, em situações de escassez interna. Caso o Brasil não se beneficie disto, outros países o farão, muitos deles sem um único pé de café plantado em seu território. Perdendo espaço frente a concorrentes estrangeiros, a indústria brasileira não só deixará de garantir empregos neste elo, como no longo prazo se enfraquecerá, podendo deixar de comprar a produção nacional. A permissão para a importação, seja em momentos de escassez interna, seja para compor blends, não significa que o café brasileiro será compulsoriamente substituído; pelo contrário, apenas aumentará o leque de opções para nossa indústria.

Restrições à importação fazem parte da rotina da maior parte dos países, e no "primeiro mundo" são abundantes os exemplos de barreiras para artigos agrícolas, das quais o Brasil é vítima. Em nossa busca pela eliminação destes obstáculos, temos aprendido que proteção na maioria dos casos beneficia a ineficiência e a apropriação de rendas desproporcionais por pequenas parcelas da população. Nossa cafeicultura vem se modernizando e tem condições de competir de igual pra igual com nossos principais concorrentes, sendo o drawback apenas uma arma a mais para a diversificação nos ingressos do setor.

Da mesma maneira, não é a restrição às importações, e sim a demanda por padrões entre governos e consumidores o que determina o respeito à regras trabalhistas, ambientais, ou ainda a busca por qualidade. Principalmente no caso do café, a postura brasileira não possui o menor efeito em termos globais, uma vez que sempre haverá outro país disposto a consumir café robusta plantado no Vietnã. Paulatinamente os países consumidores passarão a exigir cafés certificados, algo que já começa a acontecer atualmente, e será aí que aqueles que fizeram a lição de casa poderão se beneficiar. Nesse meio tempo, não há muito a ser feito do ponto de vista brasileiro, a não ser arrumar a casa.

Ideal seria se as multinacionais processassem o café no Brasil e que as marcas brasileiras fossem aceitas sem maior esforço de propaganda no mercado mundial. Infelizmente este quadro é impossível, de modo que pragmatismo é fundamental para enfrentarmos a dura concorrência enfrentada lá fora. A instituição do drawback certamente prejudicará determinados agentes, porém a manutenção da situação atual também faz suas vítimas. Desse modo, compensa seguirmos uma tendência mundial, aumentando o leque de opções para o setor no Brasil, sem que isso signifique um prejuízo tão grande para a cafeicultura nacional.

SYLVIA SAES

Professora do Departamento de Administração da USP e coordenadora do Center for Organization Studies (CORS)

BRUNO VARELLA MIRANDA

Professor Assistente do Insper e Doutor em Economia Aplicada pela Universidade de Missouri

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RENATO H. FERNANDES

TEIXEIRA DE FREITAS - BAHIA - COMÉRCIO DE CAFÉ (B2B)

EM 07/08/2007

Caros Sylvia e Bruno,

Parabéns pelo enfoque! Livre dos maniqueísmos tão presentes neste tema.

Aproveito para perguntar se sabem se o estudo que o CIC estava fazendo sobre drawback já foi publicado.

Abraços,

Renato Fernandes
ROBERTO TICOULAT

SÃO PAULO - SÃO PAULO - PRODUÇÃO DE CAFÉ

EM 20/07/2007

Prezada Sylvia e Bruno,

Seu artigo é perfeito. Gostaria ainda de acrescentar que a valorização da cadeia produtiva será somente possível a partir de produção de marcas fortes no Brasil. Existem realmente alguns poucos casos de produtores de cafés especiais, como a fazenda Ipanema ou os lotes especiais vendidos à Illy, que conseguem agregar mais valor mas se atrairmos mais indústrias para o Brasil os resultados seriam muito maiores.

Com certeza seria um estímulo para nossos produtores poderem vir a fornecer blends de cafés hoje produzidos em nossos concorrentes.

Sem dúvida para agregar valor ao nosso café, diminuir barreiras alfandegárias aos nossos produtos nos países consumidores, alavancar vendas de produtos com maior valor agregado e garantir a fidelidade ao café produzido pelo Brasil, temos de atrair os investidores estrangeiros para produzir no Brasil.

Um caso típico é o Equador, que por permitir o drawback, vem aumentando significativamente suas exportações de café solúvel para todo o mundo (somente no primeiro trimestre deste ano aumentou 42% e ao mesmo tempo reduziu suas exportações de café verde mesmo permitindo o drawback).O governo agora esta lançando um plano para expandir a produção local para ampliar a oferta de café.

Por que o Brasil tem medo de autorizar o drawback se somos o maior exportador global? Afinal, para ser o maior, temos de ser os mais competitivos. Nossos concorrentes: Colômbia, Indonésia, Vietnã, Índia, México e Equador são alguns exemplos de sucesso na importação de café via drawback.

Toda a cadeia produtiva perde e já não é sem tempo de alterarmos esta situação. Outros segmentos da nossa agricultura praticam a importação em setores que somos líderes como por exemplo: complexo soja, milho, carne, trigo, leite, borracha, algodão, cacau, entre tantos outros produtos, até mesmo coco.

É importante acelerarmos e concluirmos esta discussão dentro do setor, através do CDPC, e atrair os investimentos que hoje estão sendo direcionados para nossos países competidores.

Parabéns mais uma vez pela clareza do seu artigo.

Roberto Penteado de Camargo Ticoulat

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