Apesar de ter praticamente nascido debaixo de um pé de café, somente há 12 anos comecei a ter um olhar estratégico ou questionador para este agronegócio. Em 2002, quando decidi investigar e entender os posicionamentos do Brasil e de nossos concorrentes, fui sinalizada de que nosso maior competidor era a Colômbia, tanto em qualidade de produto, quanto em posicionamento competitivo.
Se quisermos nos posicionar novamente como líderes, não apenas em quantidade, mas em qualidade, sustentabilidade e tecnologia, precisamos nos mexer e mostrar que estamos nos movendo. Com as limitações e complexidades quando se trata de promoção de um produto brasileiro, criamos alguns objetivos e passamos a tê-los como nossas metas, conscientes de que não tínhamos os mesmos recursos financeiros do Café de Colômbia, mas muita criatividade e a mesma paixão.
Há poucas semanas, tive a honra de visitar na Colômbia o departamento (estado) de Huila, a convite do governo local e da universidade Surcolombiana. Huila é considerada uma das regiões de mais alta qualidade do café e principal ganhadora dos concursos de qualidade Cup of Excellence, considerado a maior referência de qualidade do mercado de cafés especiais.
Para preparar mais produtores para qualidade e para ascensão direta ao mercado, um grupo de empresários e a universidade decidiram criar um concurso de qualidade regional. Para a cerimônia de premiação, foi organizada uma conferência, tendo como tema ou país convidado o Brasil. Três palestrantes brasileiros foram convidados para o evento.
Em um primeiro momento, considerei, no mínimo, curioso o convite. Aquele nosso concorrente que consideramos a referência de marketing do segmento nos considera a referência? Como assim?
Neste momento, lembrei-me de uma propaganda que aqueles nascidos entre os anos 50 e 70 se recordarão: o que você quer ser quando crescer? Somos considerados como a salsicha por eles. Consideram que temos conseguido mostrar ao mundo a qualidade de nossos produtos, que temos conseguido ser muito mais sustentáveis. Que temos tecnologia e ciência em café como ninguém mais, que sabemos separar e trabalhar de forma diferenciada os cafés comerciais e os cafés especiais. Que surpresa! Nosso concorrente, a quem considerávamos o benchmark do nosso mercado, considera-nos a referência.
Com uma audiência atenta e com mais de 300 pessoas presentes, entre produtores, pesquisadores e estudantes, além do governador, o prefeito, o reitor da universidade e alguns deputados, conversei sobre a experiência de criação da Associação Brasileira de Cafés Especiais (BSCA) e sua trajetória. Respondemos a inúmeras perguntas de pessoas muito curiosas em saber o que temos feito, como estamos organizados, o que deu certo e o que não deu. Interessante... Afinal, quem é referência de quem? Quem é benchmark de quem? Será que temos nos considerado piores do que realmente somos? Será novamente nosso complexo de vira-latas?
Podem ficar tranquilos que nada que pudesse "dar munição" a nossos principais concorrentes foi dito ou apresentado. Mas fica aqui a mensagem de que, com nosso esforço, temos alcançado nossos objetivos e temos o mercado nos fazendo deferências novamente.
Não nos tornaremos arrogantes, pois isso não é de nosso perfil, dos brasileiros, mas poderemos tratar o tema de cabeça erguida, de igual para igual em nossos futuros negócios. Vocês podem me perguntar se o que vivi na Colômbia já pode ser considerado uma regra de como o mercado tem nos visto ou percebido, mas, talvez, ainda não, já que os preços pagos por nossos produtores continuam aquém de alguns de nossos concorrentes, mas já e um excelente início.
Vanusia Nogueira
BSCA – Executive Director